Verónica foi humilhada e suicidou-se depois de vídeo sexual circular entre colegas

Verónica, 32 anos. Decidiu pôr termo à vida devido à humilhação que sofria no local de trabalho. Um vídeo sexual que tinha gravado cinco anos antes começou a circular entre os colegas, em grupos do WhatsApp. Enforcou-se no último sábado.

A espanhola Verónica Rubio trabalhava na fábrica de camiões Iveco, em Madrid. Há cinco anos, gravou um vídeo a ter relações sexuais. Tinha 27 anos e era solteira. Entretanto, casou e teve dois filhos, um de nove meses e outro de quatro anos. Levava uma vida normal. Até que, há duas semanas, aquelas imagens deixaram de ser privadas. E tudo mudou.

O vídeo sexual começou a circular por grupos da aplicação de conversas WhatsApp da empresa. A equipa da Iveco em Madrid tem cerca de 2500 funcionários. A maioria são homens. Alheios ao sofrimento que estavam a causar, espalharam as imagens até todos invadirem a privacidade de Verónica. “Olha, é aquela do vídeo”, comentavam no local de trabalho, revelou um dos colegas, sob anonimato, ao jornal “El Español”. Ela não aguentou a pressão. “Lembro-me que na última quarta-feira a vi a chorar. Muitos de nós já vimos o vídeo, estava a circular nos grupos do WhatsApp. Foi tão difundido que chegou a pessoas de fora da empresa”, disse um colega, citado pelo mesmo diário digital.

Ex-namorado entregou-se à polícia

Segundo o jornal “El Mundo”, o vídeo foi partilhado por alguém que teve uma relação com Verónica no passado. Um ex-namorado entregou-se às autoridades, esta quinta-feira, e ficou detido, avança a televisão espanhola Cadena Ser. O homem, que estava a ser investigado como principal suspeito no caso, entregou-se na esquadra de Mejorada del Campo, na comunidade autónoma de Madrid.

Depois de as imagens se tornarem virais, era comum colegas apontarem para Verónica para mostrar a outros que não a conheciam quem era a “famosa” protagonista do vídeo. Pessoas que viram as imagens revelam que eram “absolutamente humilhantes” para Verónica.

“Vi um funcionário a apontar para ela para mostrar a alguém que era a mulher do vídeo. Quando o repreendi, a resposta foi: ‘se ela não se importa…'”, contou um colega.

Verónica vivia no município de Alcalá de Henares, em Madrid, com o marido e os dois filhos. Levava uma vida tranquila entre a casa e o trabalho. Tinha casado recentemente. Entrou na CNH Industrial, uma empresa do grupo Iveco, em 2006, e durante muito tempo trabalhou na linha de montagem, a fabricar camiões. No início, fazia um trabalho modesto, transportando tubos de escape num carrinho de mão. Com o tempo foi adquirindo mais responsabilidades e parecia estar totalmente integrada, estando a trabalhar atualmente no grupo Axes and Bridges, conta o “El Español”.

O pedido de ajuda nos Recursos Humanos

Na terça-feira, alguns colegas de Verónica manifestaram-se por duas vezes para condenar a situação, em frente à sede da Iveco. Tanto amigos como representantes sindicais. Na última quinta-feira, a mulher tinha ido ao departamento de Recursos Humanos da empresa para denunciar o que estava a acontecer, afirmando sentir-se assediada e com a sua privacidade violada. A empresa ofereceu-lhe outro cargo ou a demissão e encorajou-a a fazer uma denúncia à polícia, mas ela não quis, por temer que o assunto tomasse proporções ainda maiores. Foi então iniciada uma investigação interna para apurar quem havia divulgado as imagens.

Alguns colegas terão assegurado ao “El Español” que Verónica afirmou que aceitaria mudar-se para a secção de pintura e trocar para o turno da manhã, deixando o horário rotativo. Depois da sua morte, os representantes sindicais anunciaram que vão denunciar a Iveco à Inspeção do Trabalho por não ter acionado o protocolo de assédio sexual. Para a estrutura sindical estava em causa “um acidente de trabalho”, mas para a empresa tratava-se de “um assunto pessoal e não de âmbito laboral”.

Vídeo chegou ao marido. “Foi fatal”

Como se toda a pressão e humilhação no trabalho não fossem suficientes, a situação ficou ainda pior quando o vídeo chegou às mãos do marido de Verónica. Na última sexta-feira, as imagens foram enviadas à cunhada, que trabalhava na mesma empresa, que por sua vez as reencaminhou para o irmão. Quando soube, Verónica teve um ataque de ansiedade e deixou o local de trabalho para regressar a casa, acompanhada por um amigo.

“Foi fatal, imagino que esperaria por ele em casa”, explicou um colega ao “El Mundo”. Foi a última vez que viram Verónica na fábrica.

“A gota de água foi o vídeo ter chegado ao marido. Embora tenha sido gravado antes de se terem casado, na sexta-feira passada disse-me que ficou arrasada quando percebeu que ele o tinha visto”, contou o amigo àquele jornal.

Familiares disseram que a mãe de Verónica chegou a perguntar aos colegas de trabalho presentes no velório da filha qual a razão que a levou a tomar uma decisão tão drástica. Os companheiros, especialmente os que trabalhavam de perto com ela, estavam tristes. “Outros colegas achavam que era só uma piada [o vídeo] e que não magoava. Eram pessoas que ela conhecia há muito tempo, mas são más e tóxicas”, disse um dos funcionários.

2500 pessoas podem ser acusadas

Agora o caso está nas mãos da Polícia Nacional espanhola, que começou a investigar o incidente desde sábado como um suicídio, antes de saber da existência do vídeo. Ao apurar os detalhes na terça-feira, as autoridades entendem que há 2500 pessoas que podem vir a ser acusadas. Em causa está um delito de revelação de segredo, previsto na lei daquele país, com uma moldura penal que vai de três meses a um ano de prisão.

A responsabilidade pode chegar a cada um dos trabalhadores da empresa e as autoridades estão a investigar o nível de implicação de cada um, dependendo se tenham ou não partilhado o vídeo. Não interessa se foram os primeiros a enviar. Se partilharam as imagens podem ser considerados responsáveis pela morte de Verónica. O facto de a vítima ter trabalho, família, filhos e acabar por cometer suicídio aumenta a gravidade do caso e, por consequência, a futura penalização dos acusados.

 

Fonte: JN

Foto: Arquivo / Global Imagens