Os músicos Tozé Brito e José Cid vão editar, em 2022, um álbum conjunto que inclui, entre outras, canções do Quarteto 1111, de que ambos fizeram parte, proibidas pela censura, como “Domingo em bidonville”, “Pigmentação” e “João Nada”.
“As canções que estão neste álbum são canções que escrevemos juntos ao longo destes 50 anos em que trabalhamos juntos e que nos conhecemos”, disse Tozé Brito em declarações à Lusa.
Para “Tozé Cid”, o álbum, os dois foram, entre outras, “repescar canções que tinham sido proibidas pela censura”.
“Foram canções que editámos e que rapidamente foram proibidas, foram retiradas do ar e os discos retirados das lojas. Essas canções estão perdidas no tempo, têm 50 anos e pouca gente as conhece”, afirmou.
José Cid, também em declarações à Lusa, lembrou que, “no final dos anos 1960, início dos 70, existiu em Portugal o grupo mais perseguido pela censura, mais maldito, mais ousado: o Quarteto 1111”.
Entre os temas censurados na altura do Estado Novo e revisitados para “Tozé Cid”, estão “João Nada”, “Domingo em bidonville”, “Pigmentação”, “o primeiro tema que se escreve em Portugal sobre a xenofobia”, e “Lisboa ano 3000”, “uma visão estratosférica daquilo que será Lisboa ano 3000”.
No álbum está também o primeiro tema que Tozé Brito e José Cid escreveram juntos: “Todo o mundo e ninguém”.
“Um poema de Gil Vicente que o [‘rapper’ e produtor norte-americano] Jay-Z incluiu [no tema ‘Marcy Me’ de ‘4:44’] no último álbum dele”, recordou José Cid.
De fora do alinhamento ficaram temas populares como “A lenda de el-rei D. Sebastião”.
Para Tozé Brito, as canções incluídas no álbum “são extremamente atuais”.
No entanto, “com a sonoridade que tinham e a produção que tinham estavam datadas”. “Ouvias e dizias ‘estas canções são nitidamente canções dos anos 60/70’, pelo som, pelos arranjos, etc. Agora o destaque está nas vozes, a prioridade foi pôr as vozes bem à frente. E depois os arranjos são simples, muito acústicos, com órgão e alguma percussão. Penso que vai ser um álbum muito interessante”, afirmou.
José Cid corrobora, referindo que, no álbum, estão “temas que muito pouca gente conhecia, numa nova versão muito acústica”. “Nada de sintetizadores”, disse.
Em “Tozé Cid”, além de Tozé Brito, que “toca os baixos todos”, e José Cid, responsável “pelas concertinas e os acordeões”, participa também o multi-instrumentista Amadeu Magalhães, “um dos grandes músicos da música tradicional portuguesa” que, no álbum, toca gaitas de foles, flautas e violas acústicas.
O álbum, que, segundo Tozé Brito, deverá ser editado “no verão do ano que vem”, “está gravado”, faltando agora “dar pequenos toques e depois misturar e masterizar”.
José Cid fala num “documento importante para a música popular portuguesa”, que recupera “pop criativo, underground, interveniente e crítico do sistema entre 1968 e 1973”.
Tozé Brito e José Cid começaram a trabalhar juntos no Quarteto 111, banda que surgiu na década de 1960, no seguimento do Conjunto Mistério, com José Cid, Michel Silveira e os irmãos Jorge e António Moniz Pereira.
A banda começou por cantar em português, com um repertório feito de êxitos do pop rock e com o recurso a técnicas de gravação que permitiram a sobreposição de instrumentos e de sons.
O primeiro EP saiu em finais de 1967, e apresentava as canções “Os Faunos”, “Gente” e “A Lenda de El-Rei D. Sebastião”.
A faceta interventiva da banda revelou-se sobretudo no primeiro álbum, “Quarteto 1111” (1970), que abordava os problemas da guerra colonial, do racismo e da emigração, e que foi rapidamente retirado do mercado pela censura.
Com a entrada de Tozé Brito, que vinha dos Five Pop Music Incorporated, a banda abriu-se à composição em inglês, também como forma de contornar a censura, aproximando-se do que se fazia musicalmente fora de Portugal.
Apesar de ao longo da carreira ter editado vários EP e singles, o Quarteto 1111 lançou apenas mais um álbum, em 1974, intitulado “Onde, Quando, Como, Porquê, Cantamos Pessoas Vivas – obra-ensaio de José Cid”, no qual participaram José Cid, António Moniz Pereira, Mike Sergeant (que substituiu Tozé Brito, exilado no Reino Unido) e Vítor Mamede (no lugar de Miguel Artur da Silveira).
Desde a formação original, a banda sofreu algumas alterações, com a entrada e saída de vários músicos, mas é dado como certo o fim do Quarteto 1111 um ano depois do lançamento de “Onde, Quando, Como, Porquê, Cantamos Pessoas Vivas – obra-ensaio de José Cid”.
Com excepção de alguns ‘reencontros’ esporádicos, José Cid, Tozé Brito, Mike Sergeant e Michel Silveira reuniram-se em 1987 e gravaram o single “Memo/Os rios nasceram nossos”.
Madremedia