Quase 600 crianças ficaram órfãs em Portugal durante a pandemia de Covid-19

O estudo, publicado na revista médica britânica The Lancet, estima que pelo menos 1,5 milhões de crianças e adolescentes ficaram órfãos ou perderam avós ou tios entre março de 2020 e abril de 2021.

Em Portugal, 590 crianças e adolescentes terão ficado órfãos durante a pandemia de Covid-19, número que ascende a 660 se for incluída a perda de avós que tinham a sua guarda, revela um estudo publicado pela revista The Lancet.

O mesmo estudo estima que em todo o mundo, pelo menos 1,5 milhões de crianças e adolescentes ficaram órfãos ou perderam avós ou tios durante a pandemia de Covid-19, entre março de 2020 e abril de 2021. Os autores alertam ainda que o estudo apresenta estimativas por baixo.

Para este estudo, o primeiro do género à escala global, os autores desenvolveram modelos matemáticos, “usando os melhores dados disponíveis, como uma tentativa inicial de estimar a magnitude do impacto oculto da pandemia nas crianças”, refere a The Lancet em comunicado.

Os modelos matemáticos foram usados para extrapolar para o resto do mundo, inclusive Portugal, dados de 21 países que, no conjunto, representam 76,4% das mortes globais por Covid-19, adianta a publicação.

Nestes modelos foram utilizados dados sobre mortes por Covid-19 ou mortes em excesso, quando disponíveis, que ocorreram entre 01 de março de 2020 e 30 de abril de 2021, bem como taxas de fertilidade para estimar a orfandade durante a pandemia.

Os autores do estudo associaram as taxas de mortalidade por Covid-19 aos dados de fertilidade para homens e mulheres para estimar o número de crianças e adolescentes que perderam um dos pais ou ambos os pais em consequência da Covid-19.

A análise foi alargada para incluir as mortes de avós ou outros familiares adultos, com idades entre os 60 e os 84 anos, que viviam na mesma casa das crianças e que delas cuidavam, com base nas estatísticas das Nações Unidas sobre a composição familiar.

Os dados têm em conta os avós que tinham a guarda dos netos, sendo os seus principais cuidadores, e os avós ou tios que coabitavam com os pais dos menores e eram cuidadores secundários.

Para efeitos do estudo foram considerados as crianças e os jovens com menos de 18 anos e as mortes associadas à Covid-19, quer as causadas diretamente pela doença quer as que resultaram da diminuição do acesso aos cuidados de saúde e a tratamentos de doenças crónicas (como diabetes e cancro) devido à pandemia, e que contribuíram para o excesso de mortalidade.

Pelo menos um milhão de crianças e adolescentes ficaram órfãos de pai, mãe ou ambos os progenitores e meio milhão perdeu um dos avós ou tios (ou ambos avós e tios) cuidadores durante um ano de pandemia, de acordo com as estimativas à escala mundial apresentadas no artigo.

Os autores do trabalho entendem que devem ser feitos “investimentos urgentes em serviços de apoio” a estes menores, porque, a seu ver, correm riscos acrescidos de pobreza, separação familiar, institucionalização em lares ou orfanatos, perturbações mentais, suicídio, doenças crónicas, violência sexual, física e emocional e gravidez precoce.

Os países que no estudo serviram de “trampolim” para as estimativas à escala global foram Argentina, Brasil, Espanha, Colômbia, Reino Unido, França, Alemanha, Índia, Irão, Itália, Quénia, Malaui, México, Nigéria, Peru, Filipinas, Polónia, Rússia, África do Sul, Estados Unidos e Zimbabué. No caso do Reino Unido, apenas figuram dados de Inglaterra e do País de Gales.

Nestes países, o estudo estima que, em 30 de abril, por causa da Covid-19, 862.365 crianças e jovens estavam órfãos ou tinham perdido os avós que deles cuidavam diretamente.

No “grupo dos 21”, África do Sul, Peru, Estados Unidos, Índia, Brasil e México são os países que apresentam, segundo as estimativas, o número mais elevado de menores sem pais ou avós, entre 94.625 e 141.132 crianças.

Num mês, entre março e abril últimos, a Índia passou de 5.091 para 43.139 órfãos, destaca o estudo, cujos resultados os autores admitem que estão “provavelmente subestimados”, porque “as mortes por Covid-19 podem estar subnotificadas devido à variabilidade dos sistemas de notificação” e nem sempre há dados disponíveis sobre a mortalidade em excesso.

A pandemia da Covid-19 provocou pelo menos 4.100.352 mortos em todo o mundo, entre mais de 190,8 milhões de infetados, segundo o balanço mais recente da agência noticiosa AFP.

Lusa