13.12.2023 –
Dinai Alves Gomes. de 41 anos, queria esconder uma relação extraconjugal da mulher e da filha, que chegaram Portugal vindas do Brasil no dia em que cometeu os crimes. Chegou a enviar mensagens à mãe de duas das vítimas, fazendo-se passar por elas, para evitar ser descoberto.
A 26 de agosto de 2016, inspetores da Polícia Judiciária começavam a levantar o véu de um caso que, durante vários meses, estivera envolto em mistério. Três mulheres brasileiras – dadas como desaparecidas desde fevereiro do mesmo ano – foram encontradas mortas dentro de uma fossa sética, num canil em Tires, concelho de Cascais.
Michele Santana Ferreira tinha 28 anos, a sua irmã, Lidiana Neves Santana, 16, e Thayane Mendes Dias, namorada de Lidiana, já completara 21 anos.
Todos os indícios permitiram, rapidamente, identificar o responsável pelo triplo homicídio, mas este já havia escapado do País. Dinai Alves Gomes fugiu para Minais Gerais, no Brasil, de onde era natural, cerca de 20 dias depois de ter cometido o crime. Após a descoberta dos corpos, foi apanhado pelas autoridades brasileiras e está na cadeia desde 5 de setembro de 2016.
Mais de sete anos se passaram desde os homicídios, mas só agora, a 23 de novembro, é que o caso conheceu o primeiro desfecho na justiça brasileira.
Depois de inúmeros recursos e diligências que adiaram os procedimentos, Dinai Alves Gomes, atualmente com 41 anos, foi julgado e condenado a 36 anos e 10 meses de prisão “por triplo feminicídio e tripla ocultação de cadáver”, comunicou o Ministério Público Federal de Minas Gerais, que já prepara um recurso “para aumentar a pena”, pois esta “não guarda proporcionalidade com a gravidade dos crimes cometidos”.
Apesar dos homicídios terem sido cometidos em Portugal, a Constituição do Brasil não permite que cidadãos brasileiros sejam extraditados para enfrentar a justiça noutros países. Os processos são enviados para os tribunais nacionais, no âmbito de pedidos de cooperação internacional, e os arguidos julgados em território brasileiro. Neste caso, Dinai acabou punido pelo Tribunal do Júri Federal em Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais.
Qual era a relação entre o homicida e as vítimas?
Dinai, que a justiça brasileira diz ser pedreiro de profissão, emigrou para Portugal em 2004 e conseguiu um emprego no canil e gatil Quinta Monte dos Vendavais, em Tires, como encarregado geral.
Apesar de ter deixado a mulher e a filha, na altura com sete anos, em Minas Gerais, iniciou um relacionamento com Michele, em 2011. A jovem, de 28 anos, estava no País há três anos quando os seus caminhos se cruzaram.
“Testemunhas afirmaram que se tratava de um relacionamento bastante conturbado, inclusive com ameaça de morte feita pelo acusado a Michele caso ela engravidasse”, descreveu o Ministério Público Federal, pairando sobre Dinai a suspeita de uma gravidez no momento em que cometeu os homicídios.
Anos depois, em novembro de 2015, Lidiana, irmã de Michele, decidiu emigrar também para Portugal. As duas acabaram por ficar a viver na casa de Dinai e a elas juntou-se, no final de janeiro de 2016, Thayane, namorada de Lidiana.
No caso de Thayane, “foi o próprio Dinai quem intercedeu junto ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para que ela pudesse entrar no país”, lembrou o Ministério Público Federal.
O que motivou o triplo homicida?
Apenas “dois dias depois” de os quatro começarem a viver juntos, Dinai recebeu um aviso que mudou tudo e, em 24 horas, as três mulheres estavam mortas.
No último dia de janeiro de 2016, “a companheira de Dinai no Brasil avisou-o que chegaria a Portugal no início de fevereiro”.
Na manhã de 1 de fevereiro, esperou que a namorada saísse para o trabalho e cometeu os primeiros dois homicídios: “Matou Thayane e Lidiana, ocultando seus corpos no interior de uma fossa séptica que ele próprio havia montado no canil”.
Em seguida, após retirar de sua casa os objetos e documentos das vítimas, dirigiu-se ao aeroporto para buscar a mulher e a filha que haviam chegado do Brasil”, provou-se no Tribunal do Júri Federal.
Ao final da tarde, Dinai foi buscar Michele ao trabalho, em Lisboa. Matou-a também “por motivo torpe”, lembra o Ministério Público Federal, sublinhando que a motivação do pedreiro era “impedir que sua companheira no Brasil soubesse desse relacionamento e da possível gravidez de Michele”. Atirou também o corpo da namorada para a mesma fossa onde já havia colocado os corpos de Lidiana e Thayane.
Os estratagemas e as mentiras à procura do ‘crime perfeito’
Dinai procurou, por diversos meios, ocultar os homicídios para escapar à justiça com um ‘crime perfeito’.
Teve, por exemplo, “o cuidado de elevar a boia que controlava o nível da água, a fim de que a fossa ficasse quase cheia, bem como cortou o fio elétrico do alarme de aviso do nível da água e recolocou a proteção metálica sobre a fossa”, de forma a adiar a descoberta dos corpos.
Nos dias seguintes, ligou para o trabalho de Michele a anunciar que “a mãe dela tinha falecido e que, por isso, ela e a irmã haviam retornado ao Brasil”. Usou ainda uma aplicação de mensagens instantâneas para contactar a mãe da namorada, fazendo-se passar por Michele para que a família da jovem não sinalizasse o seu desaparecimento.
A fuga (com sucesso) para o Brasil e a detenção meses depois
A 22 de fevereiro, Dinai avisou uma funcionária do canil que a sogra tinha morrido e precisava de regressar ao Brasil para acompanhar as cerimónias fúnebres. No dia seguinte, levantava voo de Lisboa, pensando estar livre de suspeitas, mas o funcionário que o sucedeu no canil fez, em agosto, a descoberta macabra durante trabalhos de manutenção da fossa e avisou as autoridades.
Entre os indícios recolhidos que provam que Dinai é o autor dos crimes estão os dados de localização dos telemóveis de Michele e Lidiana que, após as suas mortes, coincidiam com os deslocamentos do homicida, “indicando que ele esteve todo o tempo na posse dos aparelhos após a prática dos crimes” para se fazer passar pelas vítimas e adiar uma investigação ao seu desaparecimento.
Dinai Alves Gomes encontra-se agora na cadeia Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, Minas Gerais.
Cláudia Machado/SIC Notícias