Entrevista ao Poeta Manuel Assunção

1 – Perfil do Poeta:

  1. a) Nome: Manuel Assunção
  2. b) Profissão: Reformado
  3. c) Residente (localidade) Ílhavo

2 – JM. – Como se define em termos de ser humano?

É sempre tarefa difícil definirmo-nos como seres humanos, porque albergamos dentro de nós facetas que são autênticos enigmas, que se escondem na parte nebulosa do nosso inconsciente. Por isso, direi que sou um ser humano como tantos outros, com meus defeitos e minhas virtudes, que espero sejam superiores aos defeitos.

3 – JM. – Os autores que mais o marcaram, foram autores poéticos

ou outros? Mencione dois ou três.

Poetas, sem dúvida. Fernando Pessoa, Augusto Gil e Eça de Queirós

4 – JM. – De alguma forma estes autores que referiu, o levaram à escrita da poesia? Refira qual o Autor.

Por estranho que pareça, quem me influenciou na escrita da poesia, foi o meu professor de português, no meu 1º ano liceal, que ao fazer-me declamar o poema, a “Balada da Neve” de Augusto Gil, me despertou, pela sua emotividade, para pensar que, sendo a poesia assim tão bela, eu um dia iria tentar escrever daquela forma simples e emotiva, como Augusto Gil descreveu o inverno e as agruras de uma criança, ao passar pela neve.

5 – JM. – A aceitação do que escreve poeticamente é analisada por si em que “meios”? (Facebook, antologias, livros publicados, saraus poéticos e/ou outros)

Sim, eu sou o meu principal crítico, daí, fazer quase como Miguel Ângelo que ao completar a fabulosa escultura de Moisés e perante tanta beleza, teve uma alucinação que o levou a agredir a escultura, gritando-lhe: “Porque não falas”? Eu não vou tão longe, mas acho sempre que o que escrevo poderia ser melhor, daí não dar grande valor ao que escrevo, tanto mais que não o faço com fins lucrativos, mas sim por prazer lúdico. Claro que não vou enveredar pela falsa modéstia, sempre que lanço qualquer poema no Facebook, dá-me alegria sentir que as pessoas, (poucas) gostam do que escrevo. Mas o que mais me induzia a faze-lo, era a minha mais “ardente” admiradora, que nunca me criticava e que colecionava tudo o que lhe mandava. Falo de minha saudosa mãe. Só por isso valeu a pena escrever poesia. A minha análise do que escrevo, fica circunscrita ao que os leitores no facebook dizem, sobre esses poemas. Fora do Facebook, actualmente nada escrevo.

6 – JM. – Defina a razão das apreensões e dificuldades que os autores têm na edição dos seus próprios livros.

Esse é um ponto muito polémico, quase tão inútil como discutir o sexo dos anjos. Quanto a mim e pelo que me tem sido dado saber, tudo se prende com o dinheiro e o fito de obtenção de lucros sem riscos. Para se editar são precisas editoras como é óbvio. Quando um poeta, desconhecido do grande público, se apresenta numa editora, com seus escritos, esta faz logo valer seus direitos, propondo ao autor que fique com uma parte substancial dos livros editados, para posteriormente ser ele a vende-los. Essa exigência põe logo a editora com os gastos da impressão e demais custos ressalvados. Claro que o autor nunca irá conseguir vender os livros que já pagou à editora e essa condicionante é logo, à partida, um entrave à publicação da sua obra. Acresce dizer que a editora que tem os mercados ao seu alcance, vende a parte dos livros com que ficou e dá uma percentagem mínima ao autor, pelo que desta forma não têm prejuízos, pois todos eles impendem sobre o autor. Daí que qualquer um ficará apreensivo, perante tais propostas condicionantes.

7 – JM. – O que encontra de verdade no que escreve para considerar que é um Autor a ser consagrado?

Os meus poemas falam dos dramas de amor, das alegrias da vida, da primavera, das flores da amizade, do amor sem barreiras nem dramas, das crianças, falam da vida dos mais desafortunados, falam das verdades que envolvem todos estes temas. Por isso não vejo como falando de tudo isto, se possa passar indiferente ao que vai ocorrendo na vida das pessoas, pois cada uma delas, muitas vezes se revê no que escrevo. Mesmo assim não quero ser um autor consagrado, quero somente transmitir o que me vai na alma convencido que é o que vai na alma de muita gente, que possivelmente não se saberá expressar da forma como o faço. Só isso.

8 – JM. – Mencione e transcreva o poema da sua autoria com que mais se identifica com o seu sentido de Autor de poesia.

Gosto de um poema que já foi declamado por um locutor meu amigo e que tem o titulo: “A alma e os poetas”.

A alma e os poetas

 

Tenho na alma os poetas

Que me dão as poesias,

Eles são p’ra mim profetas

Das tristezas e alegrias.

 

Na minha alma eles escrevem

Poesias sonhos e dores,

Porque eles são na verdade

Dos poemas os autores.

 

 

Vivem em mim à vontade

Vão esculpindo o meu sentir,

Fazem do drama a verdade

Fazem-me chorar ou sorrir.

 

Os poetas que em mim vivem

São tantos e variados,

Todos eles podem ser

Felizes ou mal-amados.

 

As poesias que escrevo

Sejam de raiva ou de amor,

Não sou eu que as planejo

Cada uma tem um autor.

 

Se alguma não agradar

Eu não sei o que fazer,

Pois nem me posso negar

Tenho mesmo que as escrever.

 

Tenho na alma poetas

Que conduzem minha mão;

E me ditam seus poemas

E eu não posso dizer não.

 

Tenho na alma poetas

Que não me deixam dormir…

Poetas que nunca dormem

E de mim não vão partir.

 

Manuel Assunção

 

9 – JM. – Mencione duas ou três razões por que há medo de ler poesia e o facto de os saraus poéticos terem pouca gente.

Incentivaria uma escola para declamadores?

 

Bom, essa é uma boa pergunta, a que tentarei responder de forma simples e directa.

O medo de ler poesia, de uma maneira geral, não se faz sentir no sexo feminino, onde a sensibilidade anda mais à flor da pele. A mulher é mais emotiva e não tem medo, nem vergonha, de chorar quando algo toca a sua alma. No caso do sexo masculino, por razões da própria masculinidade, o homem sente-se envergonhado se algo o toca profundamente, musica, poesia,

e até o encontro com alguém amado. A razão da falta de pessoas nos saraus de poesia, tem muito a ver com a falta de informação que se faz sentir nesses meios, pois normalmente são os amigos que se contactam e transmitem a informação. Os meios de comunicação nunca se inteiram dessa vertente da sociedade. Claro que incentivava uma escola de declamadores, até me faria sócio de tal obra. Se eu fosse um bom declamador, declamaria versos meus e de poetas de que gosto para gravar e oferecer a uma escola de invisuais, estes até muito mais sensíveis à poesia porque a sentem com os olhos da alma, como diz o meu amigo e poeta, Leandro Amador, no seu último livro, “Com os da alma” que aconselho vivamente a lerem.

 

10 – JM. – Que falta de apoios existem para a divulgação da poesia?

Esse é outro ponto importante e fulcral, para que a literatura poética um dia possa interessar a uma vasta área da nossa população, tanto mais que somos um povo de poetas. A falta de apoios, a meu ver, está condenada aos interesses virados para outros eventos que produzem mais interesse a quem os poderia desenvolver. Estou a referir-me às Camaras Municipais, Juntas de Freguesia, (que gastam milhares de euros fomentando festas que mais promovem desacatos e até coisas bem piores), Associações Locais, Rádios e Jornais Regionais. Depois que as televisões que tanto tempo de antena gastam com novelas, muitas delas de fraca qualidade, anúncios e noticias da vida dos chamados “vipes”. Futebol e outros desportos, muitas das vezes de jogos que se fazem lá por fora com gente que a gente nem conhece. Incentivo ao jogo via telefone quase com uma cadência de lavagem do cérebro…Enfim e o que respeita à cultura deste povo, literatura eventos poéticos teatro e outros eventos culturais, que não dão votos, zero.

11 – JM. Verifica-se que hoje em dia existem uma grande quantidade de editoras. Na sua opinião acha que neste caso o poeta tem mais opção de escolha para a sua divulgação ser um sucesso, ou muitas delas faz dos escritores lucros e números?

Julgo que já respondi a essa pergunta mas se quer eu repito. É um facto, que as editoras, com exclusão de autores já conhecidos, não investem nos novatos e deixam os custos a seu cargo. Se alguma não procede assim então eu gostaria de saber qual, pois tenho um espólio de mais de 1500 poemas que poderiam ser publicados. Claro que estou a brincar, pois não me considero assim tão bom poeta. Mas há muitos por aí de grande valor e é pena que as suas obras nunca venham a público, por causa da vil ganancia que norteia as editoras. Uma pena mesmo, pois como diz, para as editoras os escritores, são lucro e números.

12 – JM. Se já editou algum livro refira-nos quais e onde os podemos adquirir?

Não nunca editei nenhum livro, contactei uma gráfica com a intenção de publicar cem livros, com a finalidade de oferecer a familiares e alguns amigos, mas desisti porque o preço era muito elevado. Contudo foram publicados alguns poemas meus, numa antologia que envolveu 45 poetas, que tem o título de Poetas de hoje, volume II, edição levada a efeito pelo Grupo Poesia da Beira Ria – Aveiro. Foi uma iniciativa interessante porque assim muitos poetas poderão ver alguma coisa de seu, patenteado ao público.

13 – JM. Hoje em dia a divulgação online está muito avançada, possui alguma página ou site onde podemos ver algum do seu trabalho literário?

Tenho publicado alguns poemas no Facebook em Manuel M. Assunção

———————————- EM BAIXO ESCREVA O QUE ENTENDER SOBRE SI E A ARTE POÉTICA.

Sobre mim há pouco a dizer, fiz a minha vida por África, Angola, S. Tomé e Príncipe e Moçambique, de onde regressei após o 25 de Abril, com aquele ferrete ignóbil de retornado, como se fosse uma “Avis rara”. Deixei lá, alem de outros bens, todos os meus livros e meus poemas num espólio de mais de mil. Durante um tempo a poesia andou afastada de mim ou eu dela pois os problemas foram muitos. Pedi deslocação para Aveiro indo residir em Ílhavo. Depois veio a acalmia e a vontade de voltar a escreveu também regressou. A poesia para mim não é bem uma arte, considero-a mais um dom, pois que se fosse uma arte eu escreveria a todo o instante, o que não acontece. Escrevo quando algo me toca e me inspira. O olhar de uma criança, um por de sol, uma música, algo que me choca ou me alegra. Claro que todos os artistas têm que ter sempre uma fonte de inspiração. Mas os poetas, foram sempre através dos tempos, os paladinos do amor em todas as suas vertentes, os defensores da liberdade, não raras vezes pagando isso com a vida. A poesia desde a brejeira à mais sofisticada, foi sempre um bem do povo, que dela fez o Fado, as Operas e as grandes e inesquecíveis canções que perduram no tempo e pelo tempo fora.