Uma intervenção inovadora para doentes oncológicos mais velhos, que conta com um “navegador” para fazer a ponte entre o sistema de saúde, sistema social e outros serviços na comunidade mediante as necessidades do doente e da família, vai ser implementada e testada em seis países europeus, incluindo Portugal, no âmbito de um projeto de investigação que acaba de obter seis milhões de euros de financiamento.
O projeto, designado “EU NAVIGATE – Implementação e avaliação da intervenção de navegação para pessoas mais velhas com cancro e seus cuidadores familiares: um ensaio clínico randomizado pragmático e internacional”, vai ser realizado por um consórcio que junta equipas de investigadores da Bélgica (país coordenador), Holanda, Irlanda, Itália, Polónia e Portugal.
Em Portugal o estudo é coordenado por duas especialistas em cuidados paliativos da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), Bárbara Gomes e Maja de Brito, que integram os centros de investigação Institute for Clinical and Biomedical Research (ICBR) e Center for Innovative Biomedicine and Biotechnology (CIBB). Participa também Vítor Rodrigues, docente da FMUC e atual presidente do Núcleo Regional do Centro da Liga Portuguesa Contra o Cancro, instituição que vai ter um papel importante na formação e coordenação dos “navegadores”.
Genericamente, o projeto traduz-se num programa de acompanhamento de doentes oncológicos mais velhos, com 70 ou mais anos de idade, e da sua família «ao longo da trajetória da doença, incluindo o fim de vida, por uma pessoa – nomeada “navegador” – que não faz parte da equipa clínica do doente, que pode ou não ser um profissional de saúde (pode ser um voluntário), e que tem como objetivo identificar as necessidades do doente e da família e ajudar a que essas necessidades sejam supridas com os apoios existentes, em colaboração com os profissionais de saúde, outros técnicos profissionais e a comunidade local», explicam as coordenadoras da equipa portuguesa.
«O objetivo desta navegação é promover a qualidade da vida e o bem-estar do doente e da família, bem como reduzir o sofrimento relacionado com saúde. O “navegador” visa também capacitar os doentes e os seus familiares para que o acesso aos cuidados de saúde, apoio social e outros recursos aconteça atempadamente e seja equitativo. Interessa-nos acompanhar o doente ao longo de toda a trajetória da doença, assegurando uma continuidade dos cuidados», destacam.
Para avaliar os impactos da intervenção, tais como o processo de implementação, efetividade e custo-efetividade, vai ser realizado um ensaio clínico nos seis países que participam no estudo, envolvendo 532 doentes e os seus cuidadores familiares. Em Portugal participam 89 doentes.
O grande objetivo do projeto, de acordo com Bárbara Gomes e Maja de Brito, é «reduzir a carga sintomática (física e psicossocial), melhorar a qualidade de vida e o bem-estar dos doentes mais velhos com cancro e dos seus familiares. Gostaríamos de ver os doentes e as suas famílias mais capacitados e confiantes na tomada de decisão e comunicação com os profissionais de saúde».
«Com base em evidência prévia que mostra que este tipo de intervenções retira barreiras no acesso a cuidados, esperamos que o acesso a cuidados de suporte, cuidados de sobrevivência, cuidados paliativos e cuidados em fim de vida seja mais precoce, melhor em termos de qualidade e mais igualitário», acrescentam.
As investigadoras referem ainda que, do ponto de vista científico, esta investigação vai «gerar evidência sobre o modelo de cuidados pensado especificamente para as pessoas mais velhas com cancro, centrado no doente e na sua família. Trabalharemos para que este modelo seja eficaz e transferível a diferentes sistemas de saúde no contexto europeu».
Tendo em conta que a Europa «é um continente envelhecido e sabendo-se que o número de doentes com cancro com 70 ou mais anos de idade está a aumentar, no nível da sociedade, pensamos que o projeto tem potencial para melhorar a qualidade da vida num grupo de doentes que está a crescer em número e apresenta necessidades acrescidas, agravadas pela pandemia, muitas não atendidas, em comparação com doentes mais novos», concluem.
O projeto EU NAVIGATE tem a duração de cinco anos e foi aprovado com pontuação máxima no âmbito de um concurso lançado pelo “Cluster Saúde do Horizonte Europa”, um programa da União Europeia para o financiamento da investigação e inovação.
Cristina Pinto – Universidade de Coimbra – Reitoria