8.º Fórum Vê Portugal mostrou que “não há territórios condenados à partida”

Iniciativa juntou cerca de 30 especialistas, durante quatro dias, em Tomar.

Pedro Machado, presidente do Turismo Centro de Portugal, defendeu ontem que é um erro considerar que há territórios condenados à partida a ser menos desenvolvidos do que outros. A declaração foi feita na Sessão de Encerramento do 8.º Fórum de Turismo Interno “Vê Portugal”, no Cine-Teatro Paraíso, em Tomar.

“Não há territórios condenados. Temos de acabar com o mito de que há territórios predestinados para o turismo e há outros em que não vale a pena apostar. A pandemia de covid-19 provou-nos o contrário: mostrou que a diversidade e a singularidade estão presentes em qualquer um dos nossos territórios”, sublinhou Pedro Machado, durante a apresentação das conclusões do encontro, que juntou cerca de 30 especialistas em Tomar, ao longo de quatro dias de debate, numa organização do Turismo Centro de Portugal e do município de Tomar.

“O Fórum Vê Portugal, em dois dias de extraordinário debate e partilha entre instituições, trouxe à discussão os desafios que se colocam à atividade turística, como são retomar o crescimento e a confiança dos visitantes, fomentar o crescimento sustentável dos territórios, sabendo que os recursos são finitos, esbater as assimetrias de desenvolvimento, e resolver o problema da falta de capital humano, que é critico”, assinalou Pedro Machado. “A soma entre inteligência, conhecimento e sustentabilidade é a chave para o futuro desta atividade. Estamos confiantes num futuro que faz as pessoas mais felizes. O turismo é a indústria da paz”, disse ainda Pedro Machado.

Anabela Freitas, presidente da Câmara Municipal de Tomar, usou também da palavra na Sessão de Encerramento, para destacar a importância de se promoverem políticas de desenvolvimento sustentável. “Os recursos são finitos, pelo que temos a obrigação de ter no centro das políticas as sustentabilidades, que devem servir de base a todas as nossas políticas”, afirmou a autarca, que lamentou também a dificuldade que é ser empresário da atividade turística no interior do país – mais concretamente na sub-região do Médio Tejo.

“Se a política pública quer continuar a apostar no Turismo, têm de ser dadas condições aos empresários para poderem avançar com os seus investimentos. A visão do país a partir de Lisboa não é a visão do país na sua globalidade. Os empresários do Médio Tejo são prejudicados por não conseguirem efetivar os seus investimentos em tempo útil”, disse Anabela Freitas.

Painéis debateram marca Portugal e a resposta às crises
Antes da Sessão de Encerramento houve três painéis de debate estimulantes no terceiro dia do 8.º Fórum de Turismo Interno “Vê Portugal”. O primeiro painel da manhã, moderado pelo jornalista do Expresso Paulo Baldaia (que moderou todos os painéis do dia), foi dedicado ao impacto na oferta turística provocado pela pandemia.

Do lado da oferta, a crise pandémica veio alterar muitos processos, tanto em termos da hotelaria, como dos agentes de viagem ou dos operadores turísticos. Houve uma necessidade rápida de adaptação aos desafios. O que mudou e veio para ficar e quais as perspetivas para o futuro, foram algumas das questões abordadas pelos três participantes neste painel.

Joaquim Robalo de Almeida, secretário-geral da ARAC – Associação dos Industriais de Aluguer de Automóveis sem Condutor, foi o primeiro a pronunciar-se. Começando por recordar que os rent-a-car foram particularmente afetados pela pandemia, o dirigente adiantou que a recuperação da procura “já começou e está em bom andamento”, perspetivando um ano de 2022 que poderá constituir um recorde. No entanto, atualmente coloca-se um problema novo e não menos grave: as empresas de aluguer de automóveis querem comprar carros e não conseguem, devido à escassez de veículos. “O setor tem de manter os carros por mais tempo do que o previsto, mesmo encomendando com 1 ano de antecedência”, lamentou. A incipiente rede de carregamento elétrica é uma dificuldade adicional, que impede que os carros elétricos tenham maior expressão no Turismo.

Seguiu-se Pedro Costa Ferreira, presidente da APAVT – Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo, segundo o qual a pandemia “não provocou assim tantas alterações”, tanto no campo da oferta como da procura. “No início da pandemia prevemos que a recuperação da procura acontecesse de um momento para o outro e assim foi, como um interruptor”, justificou. O que está a acontecer, considerou, é que “as pessoas querem viajar e este ano têm dinheiro para isso”, o que motiva a grande procura. Algo que, no seu entender, irá mudar no próximo ano, em virtude da inflação. Ainda assim, há algumas mudanças na procura, diz Pedro Costa Ferreira: “Os turistas procuram mais autenticidade, mais viagens de menor duração e preocupam-se mais com a sustentabilidade, por pressão da opinião pública, mas no final o preço acaba por ser importante”.

Alexandre Marto Pereira, vice-presidente da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal, deixou também o seu contributo, assentindo que a pandemia não mudou assim tanto o panorama geral. “Antes da pandemia, o que se discutia era o novo aeroporto, hoje volta a estar no centro da discussão”, exemplificou. Relativamente aos números da procura, frisou que a recuperação não é uniforme. “Alguns mercados continuam com uma procura muito abaixo dos níveis pré-pandemia, como é o caso do Brasil”, recordou. O futuro desta atividade, concluiu, passa por “mais autenticidade, mais eficiência e mais sustentabilidade”.

O segundo painel teve como tema a “internacionalização da marca Portugal”. Para o debater, estiveram no palco três especialistas em marcas. Lídia Monteiro, coordenadora da Direção de Apoio à Venda do Turismo de Portugal, enalteceu a forma como Portugal é visto lá fora. “Portugal é hoje uma marca forte nos mercados externos. Uma marca que acrescenta valor aos negócios, que acrescenta valor às marcas comerciais e que ajuda a alavancar a economia portuguesa”, considerou. Recorrendo a vários estudos de branding, como o Brand Asset Valuator, explicou que a perceção de Portugal melhorou “em mercados como Espanha, Alemanha ou Brasil”, e que a marca Portugal é vista como “charmosa, de qualidade, original, atrativa, relacional e acessível”. No futuro, “queremos ser uma marca com mais valor para podermos vender mais caro os nossos produtos e serviços”, acrescentou.

José Filipe Torres, CEO da Bloom Consulting, começou por sustentar que “não existe um projeto de marca Portugal”, não se referindo especificamente ao Turismo. Lamentando que tal acontece por falta de uma aposta clara nesse sentido por parte dos decisores, o especialista defendeu que “tem de haver um kick off para a marca Portugal”. “Precisamos de trabalhar e gerir esta marca”, disse.

Carlos Coelho, CEO da IVITY Brand Corp, considerou que um dos principais problemas nesta área é o facto de Portugal ser visto como uma marca barata. “Temos um grande problema de qualidade despercebida. Há um elefante na sala: precisamos de valorizar a marca Portugal. Não podemos promover a marca do país barata. Não há nada precioso no mundo que seja barato”, justificou. Este esforço é, no seu entender, decisivo para melhorar as condições de vida dos portugueses. “Temos um passado para dar ao nosso futuro. Portugal é um país genial e podemos conseguir evoluir”, concluiu.

O terceiro painel do dia – e último do Fórum – contou com uma presença alargada de quatro oradores. O tema foi enriquecedor: “Vamos falar do futuro: há como antecipar novas crises?” Paulo Fernandes, presidente do Conselho Estratégico da Região Centro e da autarquia do Fundão, colocou o problema demográfico no foco de possíveis crises futuras. Dando o exemplo do seu município, que perdeu “metade da população em duas gerações e meia”, lembrou que quatro quintos da população do mundo tem como objetivo atingir a qualidade de vida do cidadão europeu, mas em Portugal o desafio é a demografia, o que considerou ser um paradoxo. “O país tem de se abrir mais para o mundo e diversificar os mercados. Historicamente, sempre que nos fechámos para o mundo, perdemos. E quando nos abrimos, ganhámos”, destacou.

O economista e gestor Jaime Quesado, especialista em inovação e competitividade, começou por lembrar uma frase de Peter Drucker – “O conhecimento e a informação são os recursos estratégicos para o desenvolvimento de qualquer economia” – para indicar aquelas que serão “as novas marcas do novo normal: a sustentabilidade, a qualidade, confiança, a inovação e a eficiência”. “O valor criado no Turismo deve ser partilhado de forma equilibrada junto da sociedade”, disse ainda, recordando a necessidade de outros setores crescerem tanto ou mais como o Turismo, que representa 14% do PIB nacional.

Miguel Poiares Maduro, reitor da Católica Global School of Law e Presidente do European Digital Media Observatory e do Gulbenkian Future Forum, iniciou a sua intervenção considerando que o país não se tem sabido preparar para as sucessivas crises. “É possível estarmos mais bem preparados para futuras crises. Falhámos na perceção dos riscos futuros, como aconteceu com a pandemia e a guerra na Ucrânia. É fundamental incorporar nas políticas públicas a avaliação dos riscos futuros, endógenos e exógenos”, sublinhou, ilustrando com uma metáfora. “Como somos um país pequeno, com pouca força para alterar as marés, devemos conseguir antecipar as boas ondas para surfar”.

A intervenção final do painel coube a Jorge Brandão, vogal da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, que referiu a forma como as crises inesperadas influenciam o financiamento comunitário. “Antes da Covid já tivemos os incêndios, em 2017. São crises inesperadas, que criam fatores de incerteza nos beneficiários dos fundos e nas empresas, com consequências na execução”, disse. Nem tudo é negativo, no entanto, e a região mostrou ter grande resiliência. “Muitos empreendimentos na região Centro são mais do que projetos empresariais, são projetos de vida, de pessoas que apostaram na região e são diferenciadores. Isto permite às empresas, com grande esforço, ultrapassar as dificuldades nos momentos de crise”, elogiou.