É dada como certa a cumplicidade interna de militares, cenário que já tinha sido assumido pelo próprio chefe do do Exército
A possibilidade de o material de guerra roubado em Tancos ainda estar em Portugal é uma das linhas da investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), coordenada pela Unidade Nacional de Contraterrorismo (UNCT) da Polícia Judiciária (PJ. Apesar de os peritos da PJ não acreditarem que haja mercado no nosso país para a utilização daquele género de equipamento – entre o qual lança-granadas, explosivos e granadas – a hipótese de o mesmo não ter saído do nosso país e poder estar a ser vendido à unidade não está descartada pelos investigadores.
No entanto, sublinhou ao DN uma fonte que acompanha o processo, “também está a ser escrutinado o cenário de o material já ter saído do país”, nomeadamente para Espanha, onde chegou a ser noticiado que se encontraria. Com pouco mais de uma semana de investigação, tendo em conta a dimensão e impacto do assalto, “tudo está em aberto”. Recorde-se que no comunicado a anunciar a abertura do inquérito a Procuradoria-Geral da República (PGR) assumiu ter indícios do envolvimento de redes criminosas internacionais: “Na sequência de análise aprofundada dos elementos recolhidos, o Ministério Público apurou que tais factos se integram numa realidade mais vasta. Estão em causa, entre outras, suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional”, disse a PGR. Foi por isso que o DCIAP passou a contar com a UNCT para esta investigação, além da colaboração da Polícia Judiciária Militar (PJM).
Esta quarta-feira, o governo reuniu-se com os líderes máximos das forças armadas, polícias e das secretas para analisarem a situação no país na sequência do desvio do material de Tancos e foi decidido não alterar o nível de alerta em território nacional, que se mantém “moderado”.
A cumplicidade por parte de militares que conheciam a dinâmica da (in)segurança em Tancos – vedações danificadas, patrulhas descoordenadas e sistema de videovigilância operacional – é um dos dados tidos como certos neste ponto de investigação. Aliás, foi o próprio chefe do Estado-Maior do Exército, Rovisco Duarte, a admiti-lo logo no dia a seguir a ter sido noticiado o roubo. Em declarações à SIC afirmou que o material de guerra roubado foi selecionado por quem tinha “conhecimento do conteúdo dos paióis”, acrescentando que “para haver algo deste género tem de haver informação interna”.
Os investigadores não deixam de relacionar o roubo com a autorização do Ministério da Defesa para se reparar a vedação da base militar. A notícia do DN, segundo a qual demoraram 73 dias entre o Exército declarar a existência de cabimento orçamental para a obra e a autorização do ministro, era também do seu conhecimento.
O tempo que demorou ao Exército a enviar o pedido de autorização ao ministro para as obras (33 dias) pode ter facilitado algum plano para o assalto, com ajuda interna, antes de a vedação estar reconstruída. Apesar de esta obra ser uma peça fundamental na proteção dos paióis, o Exército não terá informado o ministro da Defesa sobre essa fragilidade. Fonte oficial do gabinete de Azeredo Lopes já o tinha afirmado anteriormente ao DN – que nunca tinham recebido quaisquer alertas relacionados com falhas de segurança naquela base – mas, num esclarecimento à notícia sobre os 73 dias de demora na autorização para a empreitada (ver comunicado ao lado), reitera essa ideia: “O despacho em causa não resulta de nenhuma questão de segurança da infraestrutura em causa”, é escrito.
Os investigadores estão a ainda a recolher informação sobre os patrulhamentos junto aos paióis, para conseguir determinar um espaço temporal para a execução do roubo. Como não há registo exato dos momentos em que estas patrulhas passavam junto aos paióis assaltados, ainda não se sabe desde quando estavam as fechaduras arrombadas, facto que só foi detetado no dia 29 de junho. Não é conhecida também a data do último inventário ao material.
Fonte: DN
Foto: PAULO NOVAIS / LUSA