O presidente da Câmara do Porto acusou o Governo de ter uma “visão muito restrita” e uma política “estranguladora das autarquias” sobre a questão dos transportes, ignorando a posição dos municípios e condicionando o futuro da mobilidade das cidades.
“Gostaríamos de ir muito mais longe. Infelizmente, o Governo decidiu e tem em curso um processo de alienação dos transportes coletivos que não olha minimamente às funções inovadoras que nós queremos”, disse hoje Rui Moreira à agência Lusa, em Barcelona.
O autarca acrescentou que melhorar as condições de mobilidade é hoje – a par da água – um dos principais desafios das cidades, algo que, considerou, o Governo está a ignorar. “Há da parte do Governo uma visão muito restrita da questão dos transportes. Uma visão estranguladora das autarquias. Quer Lisboa quer o Porto manifestaram interesse em participar num debate vivo com o Governo sobre esta matéria. Não se tem conseguido”, alertou.
Rui Moreira está em Barcelona para participar no “Smart Cities World Congress”, considerado um dos principais eventos mundiais sobre cidades e mobilidade inteligente.
Segundo explicou o autarca, um estudo encomendado à Universidade Católica e recebido na sexta-feira, “demonstra que o modelo de concessão de transportes no Porto aponta para uma perda de qualidade nos transportes”.
Acusando o Governo de lidar com o assunto “exclusivamente sob o ponto de vista economicista, sem olhar para as externalidades”, Rui Moreira recordou o impacto negativo de uma cidade que não tem transportes públicos e onde as pessoas não se podem movimentar facilmente.
“Temos vindo a notar um aumento do transporte individual por causa de não haver transporte público. O Governo está a tentar equacionar esta rede como ela existe, piorando até a frequência”, disse, afirmando que uma cidade só evolui “no conceito da proximidade”.
“Conseguimos atrair pessoas para a cidade convencendo-os de que a distância é curta. Mas se essa distância tem de ser feita no transporte individual, com parqueamento, consumo de gasolina, maçadas, incómodos, estamos a andar a contrário do que devem andar as cidades”, sublinhou.
No Porto, revelou, um dos objetivos é fechar mais ruas ao trânsito automóvel, com “enorme sucesso” em experiências recentes de pedonalização como a da Rua das Flores, fomentando os corredores de autocarros. “Gostaríamos de aumentar os corredores autocarros mas só se houver uma oferta de transporte coletivo. Não podemos estar a criar corredores ‘bus’ se não houver autocarros”, disse.
Para Rui Moreira, o debate é também prejudicado pela Associação Nacional de Municípios (ANMP), que tem “outras preocupações e outras agendas”, citando como exemplo a falta de debate sobre os fundos estruturais europeus. “Chamei a atenção em janeiro para o facto de haver inércia e indefinição sobre esses fundos. Fui muito criticado pelo Governo e por outros autarcas. Mas passaram vários meses e hoje ainda não sabemos, não discutimos coisas tão importantes como, por exemplo, como vamos utilizar esses recursos”, disse.
O metro do Porto “é um projeto que não deveria deixar de estar inscrito e não está. São estes aspetos estratégicos que deveriam estar em debate mas ficam longe da discussão nas áreas metropolitanas, na ANMP e no Governo central”, concluiu Rui Moreira.