“A região da Bairrada é de longa data conhecida como produtora de vinhos de qualidade”. É esta a frase que se pode ler no primeiro parágrafo da Portaria n.º 709-A/79A, que a 28 de Dezembro de 1979 cria a Região Demarcada da Bairrada. Celebram-se assim 40 anos de uma efeméride que a Comissão Vitivinícola da Bairrada (CVB) decidiu assinalar ontem, dia 14 de Janeiro. A data não foi escolhida ao acaso: para além de assim poder contar com a presença da Ministra da Agricultura, Maria do Céu Albuquerque, aconteceu precisamente 4 meses depois da apresentação de uma nova identificação visual, materializada numa marca colectiva e identitária da região.
Pedro Soares, Presidente da Comissão Vitivinícola da Bairrada (criada em 1986), resumiu de forma breve o percurso destes últimos anos, muitas vezes atribulado, mas acima de tudo singular e genuíno, prestando homenagem a todos os que têm vindo a defender e valorizar o território, as uvas e os vinhos produzidos na Bairrada. Mais do que focar-se no passado e adivinhar o futuro, apelou à importância de nos concentrarmos no presente, através de acções assentes na pluralidade – “Valorizar de forma conjunta, porque juntos somos mesmo mais fortes!” – e no conhecimento – “Temos que fazer melhor com base no conhecimento. Temos que errar menos. Para uma Região Demarcada, a (co)criação de valor é fundamental.”. Acredita que o papel das Comissões Vitivinícolas não se deve resumir à mera certificação de produtos ou à produção. “Temos que estar atentos a todo o ecossistema vitivinícola, desde a produção de uvas, às preocupações ambientais; da gestão equilibrada dos recursos, ao enoturismo; ou à sustentabilidade, não esquecendo a inovação.”, acrescenta.
A Ministra da Agricultura esteve na região, tendo começado a sua jornada no Museu do Vinho Bairrada, que visitou e onde promoveu uma reunião de trabalho com representantes de diferentes instituições ligadas à região e ao vinho. Seguiu-se o almoço comemorativo dos 40 Anos da Região Demarcada, no Curia Palace Hotel, e uma visita às Caves São João.
Maria do Céu Albuquerque mostrou-se muito satisfeita com esta visita, até porque “mais do que preocupações, ouvi projectos; e projectos muito interessantes, nomeadamente aquele que passa pela criação do Centro de Investigação do Espumante, com o objectivo de trabalhar a produção, mas também criar melhores condições para aumentar o seu consumo interno e colocá-lo de forma mais competitiva no mercado externo. Este projecto vem completamente ao encontro da estratégia do Governo e que passa pela criação, a nível nacional, de um conjunto de centros de investigação e de estações experimentais, revitalizando equipamentos existentes, envolvendo o Ministério da Agricultura em parceria com os actores do território, como as Câmaras Municipais, as Comunidades Intermunicipais, mas também instituições de ciência e tecnologia. É uma forma de criarmos condições para promover a agricultura, os seus produtos e aumentar a sua quota na economia nacional. Em breve vamos apresentar a nossa agenda para a inovação, onde esta vertente vai estar disponível e entrar em discussão pública.”.
Bairrada, um retrato de há 40 anos atrás
De acordo com os dados disponíveis inerentes à época, o total de hectares de vinha correspondia a 12.000 hectares e a produção vínica provinha das adegas cooperativas – de Águeda, Cantanhede, Mealhada, Mogofores, Souselas e Vilarinho do Bairro. Grande parte da actividade económica era garantida pelas caves vitivinícolas e a maioria do produto comercializado era feito a partir de lotes de vinho adquiridos a baixo custo a produtores de outras regiões do país. Depois de engarrafado, era vendido, sobretudo, para o mercado externo, nomeadamente para as ex-colónias portuguesas, particularmente, o Brasil. A proximidade dos portos da Figueira da Foz, de Aveiro e de Leixões era decisiva para o negócio. O número de produtores engarrafadores era muito residual.
A Bairrada no presente
Atualmente, a Região Demarcada da Bairrada, que se situa entre os rios Vouga (a Norte) e Mondego (a Sul) e as Serras do Buçaco (a Oeste) e do Caramulo (a Este), é constituída por oito concelhos – Águeda, Anadia, Aveiro, Cantanhede, Coimbra, Mealhada, Oliveira do Bairro e Vagos – e contabiliza cerca de 2.400 produtores de vinhos, que exploram quase mais de 6.000 hectares de vinha. “Perdemos muita área de vinha, que estamos a começar a recuperar, assim como uma imagem positiva da região.”, esclarece Pedro Soares. Há cerca de 110 produtores inscritos na Comissão Vitivinícola da Bairrada, dos quais 84 colocam no mercado vinho com o selo de Denominação de Origem (DO) Bairrada.
A região produz mais de 50% do espumante nacional, sendo o mercado nacional o seu maior consumidor, seguido do Brasil, Canadá e Estados Unidos da América. Os números de 2019 são positivos, apontando para um crescimento em certificação, preço médio do vinho espumante transaccionado e preço das uvas.
Em 2019, a Bairrada produziu mais de 21 milhões de litros de vinhos, espumantes e tranquilos. Houve uma quebra de 15% na produção de brancos e de 5% de tintos, mas “foi compensada pela qualidade”, afimra Pedro Soares
Quatro décadas de Região Demarcada
Sobre a defesa do território e da marca Bairrada, ambas são de extrema importância para a CVB. “O sector do vinho é o único que suporta, verdadeiramente, a promoção contínua da marca Bairrada”, justifica Pedro Soares. “Nos últimos dez anos, a consciência da importância de estarmos unidos em torno de uma marca colectiva tem sido muito maior por parte de todos e o facto de empresas, como as tradicionais caves, que apenas engarrafavam, passarem a ter vinhas e/ou controlo sobre as uvas, fez com que também tenham de apostar de forma evidente na marca da região.”
A qualidade e a diferenciação são as principais características da região. A influência Atlântica, o tipo de solos, as castas e as pessoas são apontados como factores diferenciadores da Bairrada. “Somos os líderes em termos de produção de espumante nacional e queremos ser também a região que pode alavancar o espumante como um produto de interesse colectivo e não como um subproduto”, acrescenta Pedro Soares.
Contudo, o negócio traduzido em baixo preço e em volume, a confusão entre o vinho não certificado e os produtos com Denominação de Origem, bem como a utilização da marca Bairrada na comunicação e produtos quando as uvas não são provenientes da região e/ou os produtos não são submetidos ao processo de certificação são tidas, durante estas quatro décadas, como as maiores dificuldades face ao trabalho realizado pela CVB. “Sempre que alguém faz passar um produto não certificado, como sendo Bairrada, está a prejudicar de forma evidente aqueles que trabalham para a promoção da marca coletiva e que cumprem as regras”, explica Pedro Soares.
O futuro do espumante bairradino
A produção de espumantes na Bairrada regista uma quota de mercado de mais de 50%. O incremento deste produto também está associado ao projeto Baga Bairrada, fundado em 2015, com o objectivo de valorizar, demarcar e autenticar a (tinta) Baga, a casta-emblemática da região e, ao mesmo tempo, evidenciar a diferenciação dos espumantes Bairrada, no sentido de assegurar o crescimento dos chamados ‘Blanc de Noirs’.
A escassa informação sobre a produção de espumante é uma realidade actual. Por essa razão, a CVB aposta na criação urgente de um centro/plataforma baseado na aquisição de conhecimento sobre o espumante. A finalidade é fomentar a aprendizagem e definir conceitos inerentes a este tipo de vinho produzido, quer na região bairradina, quer a nível nacional.