Sem surpresas, a Saúde foi “O” tema do primeiro debate sobre política geral da XV legislatura.
Oito meses depois, o primeiro-ministro António Costa regressou ao Parlamento para responder, durante quase cinco horas, aos deputados no primeiro debate sobre política geral da XV legislatura. O arranque ficou a cargo do líder parlamentar do PSD e o tema dominante, como se esperava, foi a saúde, com o chefe do Governo a ‘segurar’ a ministra Marta Temido, que os sociais-democratas pediram que fosse substituída.
Considera aceitáveis estas falhas de cobertura como se fosse um serviço de saúde de país do terceiro mundo? Assume a responsabilidade por essas deficiências?“. Assim arrancou o debate, desta quarta-feira, na Assembleia da República (AR). A pergunta partiu da bancada social-democrata e António Costa não hesitou na resposta, mostrando desde logo ao que vinha: segurar Marta Temido.
Até prova em contrário, só há uma pessoa que escolhe os membros do Governo e neste momento sou eu, e eu assumo a responsabilidade por tudo o que fazem os membros do Governo que escolhi“, respondeu Costa.
Ainda assim, as críticas continuaram não só à direita, com a IL a denunciar que Portugal é um país “à espera” e em vários setores, mas também à esquerda, com a coordenadora do BE a acusar o Governo de ter escolhido “ignorar os alertas” e o PCP a contestar as “promessas” feitas e não cumpridas.
A todos, o primeiro-ministro respondeu, não deixando de recordar o impacto no SNS dos dois anos de pandemia e de vários meses, do que designou, de uma crise política “inútil”. Além disso, e puxando pelo político que há em si, Costa não quis fechar a primeira ronda do debate sem um alerta sobre a direita que, disse, vive uma “crise existencial”.
O momento mais tenso foi protagonizado pelo líder do Chega e António Costa, já o deputado da IL, Rodrigo Saraiva, contribuiu para animar os ânimos, na segunda ronda do debate, com o “rolo compressor das promessas”.
Abaixo pode rever os principais momentos do debate que marcou o regresso do chefe do Governo ao Parlamento para uma discussão com os deputados sobre política geral. O último, recorde-se, aconteceu a 7 de outubro de 2021, algumas semanas antes do chumbo do Orçamento do Estado para 2022, e que teve como consequência a dissolução do Parlamento no início de dezembro e a convocação de eleições antecipadas para 30 de janeiro deste ano, que o PS venceu com maioria absoluta.
AR DÁ LUZ VERDE A APOIO, PCP VOTA CONTRA
O debate terminou com a votação, já sem a presença do primeiro-ministro, e aprovação do apoio de Portugal ao estatuto de candidato da Ucrânia à UE.
Sem surpresas, o PCP foi o único partido a votar contra a resolução, que foi apresentada pelo deputado único do Livre, Rui Tavares
E O NOVO AEROPORTO, PERGUNTOU O PCP
A líder parlamentar do PCP levantou a questão: a localização do novo aeroporto de Lisboa. Paula Santos criticou a “falta de vontade de política para enfrentar os interesses da Vinci” porque a solução que dá respostas às necessidades das pessoas “é a construção faseada do novo aeroporto no campo de Tiro de Alcochete”.
(…) Aguardo serenamente que a nova liderança do PSD diga qual é a sua posição: se é a posição de exigir a avaliação ambiental estratégica, se é a de retomar a decisão do Governo do doutor Pedro Passos Coelho, se é uma outra nova decisão de forma a que haja o consenso nacional suficiente“, respondeu Costa.
Aquilo que o primeiro-ministro não quer é tomar “uma decisão sobre um processo que nunca estará concluído antes de outubro de 2026 e haja o menor risco de vir a haver um outro Governo e uma nova maioria que revertam os passos que agora vão ser dados”.
“Porque os passos que agora forem dados têm que ser os passos para uma decisão final e irreversível para termos de uma vez por todas um novo aeroporto na região de Lisboa“, avisou a deputada comunista.
CATARINA E COSTA PARTE II – O DEBATE TENSO
Na segunda ronda, Catarina Martins usou da palavra pela segunda vez para protestar contra “piadolas” que terão sido antes transmitidas pelo líder do executivo e para acusar o Governo do PS de estar “a fazer o trabalho da direita” na área da saúde.
Registo que o Governo reconhece que há falta de especialistas no SNS, mas não registei uma única proposta concreta para haver especialistas no SNS. Podemos discutir a formação, mas a questão é que demora dez anos a formar um obstetra. Temos médicos, mas a questão é que boa parte deles estão no privado“, observou, vincando que “um plano de contingência, que não é mais do que um plano rotativo de fecho de urgências não adianta nada”.
A resposta do líder do executivo foi pouco ou nada amigável: “Desculpe lá, não vale a pena exaltar-se nem pôr esse tom de voz para ver se convence os portugueses que tinha razão quando chumbou o Orçamento e provocou uma crise política – e os portugueses não lhe reconheceram essa razão“.
Os portugueses não lhe reconheceram essa razão porque a senhora deputada bem pode reconstruir a história, mas não foi o Bloco de Esquerda quem fundou o SNS. E até lhe posso dizer mais: O SNS não deve nada ao Bloco de Esquerda para a sua melhoria”, advogou.
O ROLO COMPRESSOR DAS PROMESSAS
O episódio, que animou os ânimos na AR, foi protagonizado pelo deputado Rodrigo Saraiva, da IL.
Desenrolando o rolo que designou “rolo compressor das promessas”, o deputado contestou as “comissões de acompanhamento, task force e grupos de trabalho que existem neste país, é vasto, é longo”.
SE HOUVER NOVA FALHA, “HÁ DEMISSÃO”
O tema foi introduzido na segunda ronda do debate pelo líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, que questionou António Costa sobre declarações recentes do ministro José Luís Carneiro, que assumiu ao jornal Público ter existido, num dia específico, uma falha de comunicação do SEF na origem de longas filas no aeroporto de Lisboa e que uma repetição levaria “à substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto”.
Na resposta, António Costa manifestou concordância de que existiu uma falha num dia em que desembarcaram mais de 3.000 passageiros em simultâneo no aeroporto de Lisboa e não foi comunicada à direção nacional do SEF a necessidade de ativar a equipa de contingência.
“Não foi comunicado, foi uma falha, o ministro sinalizou o que havia a sinalizar, repetindo isto há demissão“, assegurou.
O TEMA DELICADO QUE O PSD LEVOU A DEBATE: ACOLHIMENTO DE REFUGIADOS
O deputado do PSD, André Coelho Lima, questionou o chefe do Governo sobre o acolhimento de refugiados ucranianos por cidadãos russos na Câmara Municipal de Setúbal.
Mostrando-se ciente “da delicadeza desta matéria” e dos “limites do segredo de Estado”, o deputado social-democrata abordou, no entanto, as diversas audições que tiveram lugar na Assembleia da República sobre a matéria para estabelecer que o primeiro-ministro tinha sido informado da situação no município.
Resta a pergunta sacramental em função disto, que é: o que fez o senhor primeiro-ministro e o seu gabinete com essas informações?“, inquiriu Coelho Lima.
Na resposta, António Costa sublinhou que, quanto aos relatórios dos serviços de informação que lhe são transmitidos, faz o que lhe “compete fazer” e não lhe “compete dizer mais”, uma vez que a Assembleia da República tem “formas próprias de acompanhar a atividade dos serviços de informações” e de “conhecer a informação produzida pelos serviços de informações”.
Se o senhor deputado tem dúvidas se o primeiro-ministro de Portugal agiu adequadamente ou não adequadamente em função de uma informação em específico, a única coisa que eu lhe posso dizer é que, nestes seis anos, tenho em boa consciência ter agido sempre adequadamente em função das informações que me foram disponibilizadas“, disse.
COSTA FECHA PRIMEIRA RONDA COM ALERTA PARA “CRISE EXISTENCIAL” À DIREITA
Na sequência da intervenção do líder parlamentar do PS, na qual acusou o PSD de explorar problemas conjunturais para colocar em causa o SNS, António Costa referiu-se ao PPD (Partido Popular Democrático) fundado por Francisco Sá Carneiro em 1974, mas que poucos anos depois passou a chamar-se PSD (Partido Social Democrata) com o objetivo de integrar esta família política no espaço europeu.
“Percebo que há partidos que têm uma crise existencial de se terem querido rebatizar de uma família ideológica que não é a sua, que nunca os reconheceu e onde eles nunca conseguiram entrar. O PPD que era PPD quis-se inventar PSD, mas, obviamente, não cabem lá, não são“, sustentou António Costa, líder do partido que pertence à família das sociais-democracias do norte e centro da Europa.
Mas Costa foi mais longe e defendeu mesmo que essa “confusão” com o nome da maior força política da oposição “fez com que até o deputado André Ventura tenha sido militante e candidato desse partido ainda há muitos poucos anos, tal a confusão do que é o PSD”.
“DIREITA QUER APROVEITAR-SE DO SNS”
O encerramento da primeira ronda de perguntas coube ao líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias, elogiou a honestidade do PSD por assumir que os “problemas não começaram agora”.
Eurico Brilhante Dias recusou depois que o PS tenha algum dogma ideológico em relação à política de saúde seguida em Portugal, argumentando neste ponto que “as inovações no SNS partiram sempre de governos socialistas”.
“Aquilo que a Direita quer fazer é aproveitar-se de uma conjuntura para aproveitar-se do SNS, que é património de todos“, contestou o socialista, assegurando que o PS não vai permitir que isso aconteça.
SIC Notícias