O governo PS recusa o essencial das condições que o Bloco de Esquerda impôs para viabilizar o Orçamento Retificativo através do qual se alarga o limite da dívida para poder cobrir a intervenção estatal no Banif. A saber: controlo governamental da autoridade de resolução bancária (agora essa autoridade pertence ao Banco de Portugal) e a colocação do Novo Banco na esfera pública, com controlo estatal – e, portanto, extinguindo-se a intenção de venda.
Ontem, o ministro das Finanças foi à comissão parlamentar de Orçamento apreciar o Orçamento Retificativo que o governo teve de apresentar à pressa para encaixar nas contas públicas – e que hoje será discutido e votado no hemiciclo.
Mariana Mortágua apresentou as condições do Bloco e depois o secretário de Estado adjunto do ministro das Finanças, Mourinho Félix, disse-lhe, no que toca à governamentalização da autoridade de resolução, que “o PS não abdica” do seu compromisso com as “regras europeias” do setor – dizendo estas que é o supervisor quem controla a resolução e não o governo.
Quanto à outra condição – estatização do Novo Banco -, foi o próprio ministro, Mário Centeno, quem deu a nega ao BE, dizendo que a recapitalização da instituição será feita de modo que “não imponha mais custos para o contribuinte”. Por outras palavras: Centeno não quer controlo público do Novo Banco. Tudo o que o governo admite, para já, é uma “reflexão” sobre a separação entre supervisão bancária e entidade de resolução, porque, como reconheceu Mourinho Félix, há um problema de “conflito de interesses”.
Em suma: à esquerda do PS, a disponibilidade para viabilizar o Orçamento Retificativo é pouca (no Bloco) ou nenhuma mesmo (PCP e PEV anunciaram que vão votar contra). Com esses votos (36 ao todo, 19 do BE e 17 da CDU), o governo de António Costa não poderá contar. É a primeira divisão importante desta legislatura na frente de esquerda que dá suporte parlamentar ao executivo.
Seja como for, a esta divisão da esquerda poderá também corresponder uma divisão da direita.
O PSD irá hoje viabilizar o Retificativo. Porém, o CDS não o deverá fazer. Fonte próxima da direção centrista disse ontem ao DN que o partido estava a analisar a audição de Centeno no Parlamento. A “inclinação era para um voto negativo” – mas só depois do fecho desta edição do DN isso seria decidido.
O primeiro a abrir a porta no PSD à viabilização da proposta governamental foi o próprio líder do partido, Passos Coelho, que admitiu não ter uma solução melhor para o Banif do que a encontrada pelo governo.
“Com a experiência que tenho (…) admito que não teria uma solução muito diferente desta que foi adotada”. Isto porque – e aí defendeu os atos durante a sua governação – “não foi possível identificar ao longo destes anos um comprador para o Banif”.
O DN confirmou depois com várias fontes da bancada social-democrata que a decisão deverá pender no sentido da abstenção. “Possibilidade real”, disse um deputado do PSD. “Hipótese mais provável”, apontou outro. Um deles sugeriu que se olhasse com atenção para as declarações do líder parlamentar.
Luís Montenegro destacou que “a responsabilidade da aprovação das iniciativas do governo cabe aos partidos que suportam o governo”. O líder da bancada do PSD acrescentou ainda que esta seria “uma boa oportunidade de os partidos que suportam o governo construírem uma posição política conjunta, que foi, aliás, aquilo que sustentou o início de funções deste governo”.
Atente-se na semântica: Montenegro diz que a “responsabilidade de aprovação” é da oposição. Mas a responsabilidade de viabilização já pode ser do PSD, em nome do “interesse nacional”. Foi o que explicou fonte parlamentar do PSD ao DN, que disse que “faz muito mais sentido a abstenção do que votar a favor”.
A juntar a isto também os deputados eleitos pelo círculo da Madeira (são três) vão tomar uma posição no sentido de viabilizar o Orçamento. Quem o confirmou foi o próprio presidente do PSD-M, Miguel Albuquerque: “Não votar contra o Orçamento Retificativo foi a indicação que dei aos deputados, uma vez que este vem resolver uma situação que para nós é muito importante, que é a manutenção dos depósitos e assegurar os depósitos no Banif e os postos de trabalho.” Quanto às duas opções em aberto não revelou a decisão, dizendo que “pode tanto ser abstenção como o voto a favor”.
Uma eventual abstenção do PSD (89 deputados) até poderá permitir que todas as outras bancadas (exceto a do PS, claro) votem contra. BE+CDS+CDU+PAN somam 55 deputados – portanto, bastante menos do que os 86 do PS.
Fonte: DN