O fim do Autovoucher, os apoios à indústria e outras medidas de emergência para conter aumento dos preços

Acaba o Autovoucher, substituído por uma diminuição expressiva do ISP; aumentam os apoios à indústria e agricultura; e acelera o investimento em alternativas energéticas. O governo anunciou hoje as medidas de emergência direcionadas à contenção dos aumentos de preços dos bens energéticos e agro-alimentares aprovadas no final da semana passada.

Mariana Vieira da Silva anunciou esta segunda-feira um pacote de medidas, em quatro eixos, para enfrentar o aumento generalizado dos preços.

O objetivo, anunciou o governo, é dar uma “resposta focada e dirigida, evitando a propagação das pressões inflacionistas e protegendo, assim, as empresas e as famílias”.

Para o executivo, trata-se de “um pacote de medidas extraordinárias de resposta imediata para conter os impactos sociais e económicos da guerra” na Ucrânia.

Quatro ministérios foram convocados para apresentar medidas para a contenção dos preços:

Medidas nas Finanças

  • Redução do ISP no equivalente à redução da taxa do IVA para 13%, eliminando-se, para o efeito, os atuais limites mínimos de tributação em ISP;
  • Alargamento do regime de flexibilização de obrigações fiscais no primeiro semestre de 2022, para empresas de setores particularmente afetados pelo aumento dos preços da energia (e.g., agricultura, pescas e setor social e solidário);
  • Implementação de obrigação sobre a ERSE de publicação de relatório trimestral detalhado relativo à formação dos preços de venda ao público dos combustíveis.

Medidas na Economia e Mar

  • Programa Apoiar Indústrias Intensivas em Gás, com apoio a fundo perdido que cubra 30% da diferença entre os custos incorridos em 2021 e os incorridos em 2022, até um limite de 400 mil euros para cada empresa;
  • O ministro da Economia e do Mar afirmou hoje que o imposto sobre os lucros extraordinários das empresas não foi discutido no Conselho de Ministros, mas admitiu que o Governo está estudar “todas as possibilidades”. “Estamos a radiografar completamente todos os setores da atividade e, se houver lugar à existência de lucros inesperados e que são aleatórios, estaremos atentos, porque o Estado não tem recursos infinitos”, declarou Costa Silva.

  • Na sexta-feira, no parlamento, o governante admitiu que o Governo iria “falar” com as empresas e “provavelmente considerar um imposto, um ‘windfall tax’ [taxa de imposto sobre lucros que resultam de ganhos inesperados de empresas ou setores específicos], para os lucros aleatórios e inesperados que estão a ter. O ministro da Economia explicou hoje que o ‘windfall tax’ foi uma das hipóteses avançadas pela Comissão Europeia e que Portugal tem essa medida como “uma solução única, caso venha a ser necessária”.

Medidas no Ambiente e Ação Climática

  • Adequação do regime de avaliação de impacto ambiental nas situações de avaliação caso a caso, quando estejam em causa projetos de centros eletroprodutores  de fontes de energia renováveis que não sejam localizados em áreas sensíveis;
  • Adequação dos regimes de de avaliação de impacto ambiental e de prevenção e controlo integradas da poluição para a análise e decisão dos projetos de produção de hidrogénio por eletrólise da água cujo processo produtivo seja isento de perigosidade e de poluição.

Medidas na Agricultura e Alimentação

  • Reserva de crises: 9,1 milhões de euros para suinicultura e produção de ovos e aves, mais 18,2 milhões de euros para mitigar custos acrescidos de alimentação animal e fertilizantes;
  • Redução do ISP para o gasóleo colorido e marcado agrícola — redução em 3,432 cêntimos/litro até final de dezembro;
  • Flexibilização de pagamentos fiscais e de contribuições para a segurança social;
  • Compensação excecional destinada aos titulares de licença de pesca para compensar o acréscimo de custos de produção;
  • Isenção de IVA nos fertilizantes e rações;
  • Estender ao interior do país o programa da Docapesca de compra de pescado e entrega, através das juntas de freguesia, a famílias mais vulneráveis;
  • Reforço das verbas de apoio à instalação de painéis fotovoltaicos, em 2022 e 2023 (agroindústria, exploração agrícola, aproveitamentos hidroagrícola).

A informação foi avançada esta segunda-feira num briefing sobre as medidas tomadas pelo Conselho de Ministros eletrónico realizado em 8 de abril. A reunião do executivo para a aprovação das medidas de emergência direcionadas à contenção dos aumentos de preços dos bens energéticos e agro-alimentares seguiu-se ao anúncio das medidas, na Assembleia da República, durante a discussão do programa do terceiro governo chefiado por António Costa.

Apoio ao cabaz alimentar alargado a todas as famílias que recebem prestações sociais

O governo anunciou ainda o alargamento do apoio ao cabaz alimentar, de 60 euros mensais, a todas as famílias titulares de prestações sociais, face ao atual regime que abrangia apenas as que tinham tarifa social de eletricidade.

Mariana Vieira da Silva explicou que o governo iria avançar para um “alargamento do universo de beneficiários face ao definido” das medidas de apoio ao preço do cabaz alimentar a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas.

Questionada sobre a margem para ajustamento do valor, a governante disse que “estará sujeito a avaliação conforme a situação evoluir. Quando aprovámos dissemos que depois faríamos uma avaliação”, frisou.

Mariana Vieira da Silva precisou que em abril será pago o apoio que já estava decidido e que o alargamento ocorrerá no mês seguinte.

O governo anunciou também o alargamento das medidas de apoio à aquisição de botija de gás, no valor de dez euros, a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas.

O apoio extraordinário para as famílias mais vulneráveis foi criado pelo governo com o objetivo de compensar o aumento nos preços dos bens alimentares de primeira necessidade, devido ao conflito na Ucrânia.

Até agora apenas tinham direito ao apoio ao preço do cabaz as famílias abrangidas pela tarifa social de eletricidade em março, mês em que o número de beneficiários abrangidos era em março de 762.320.

Nova redução do ISP terá um custo de 80 milhões de euros por mês

A redução do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) equivalente à redução do IVA para 13% terá um custo de cerca de 80 milhões de euros por mês em perda de receita fiscal, afirmou o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

“Esta medida poderá custar cerca de 80 milhões de euros por mês de perda de receita fiscal”, disse hoje António Mendonça Mendes, em conferência de imprensa, referindo que a intenção é que entre em vigor em maio, substituindo o Autovoucher, em vigor até ao final deste mês.

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais explicou que se a Comissão Europeia autorizar a redução do IVA da energia de 23% para 13% a medida de redução do ISP será substituída por essa.

O governante explicou “por exercício académico” se “a Comissão Europeia viesse autorizar substituiríamos esta medida do ISP por essa, que é mais direta, e seria tansitória”.

“A diretiva do IVA não permite, e bem, que os combustíveis sejam taxados a taxas reduzidas”, afirmou, acrescentando que existe “um grande consenso na União Europeia que devem acabar todos os subsídios fiscais aos combustíveis fósseis”.

Mendonça Mendes frisou que esta é uma “medida excecional” e que será avaliada no “final de cada trimestre” sobre “se se mantêm as circunstâncias”.

O secretário de Estado detalhou que o Autovoucher termina no final deste mês, conforme previsto, tendo sido opção substituir pela medida do ISP, uma medida que, disse, “é mais universal” e “não tem limite em termos de utilização”.

Governo simplifica procedimentos para acelerar investimento em renováveis

A ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, explicou ainda que uma das respostas para fazer face à escalada dos preços da energia passa por adotar medidas que “permitam que o caminho da transição energética possa ser acelerado, desde a redução da taxa mínima do IVA dos equipamentos elétricos, agilização do licenciamento de painéis solares, simplificação dos procedimentos relativos à descarbonização da indústria e reforço de 46 milhões de euros para instalação de painéis fotovoltaicos em 2022 e 2023”.

“Esta transição permite uma maior autonomia do nosso país, e já é responsável por termos preços de energia não comparáveis com outros países da Europa”, defendeu a governante no ‘briefing’ do Conselho Ministros, onde foi apresentado um novo pacote de medidas, aprovado na sexta-feira, para ajudar empresas e famílias.

O ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, precisou que a “guerra da Ucrânia veio evidenciar a dependência de combustíveis fósseis” e mostrar a necessidade de “acelerar conjunto de medidas desenhadas para 2030 para atingir a neutralidade carbónica”, nomeadamente a simplificação e a diminuição de prazos de análise e de decisão num conjunto avaliação de impacto ambiental para projetos renováveis.

O executivo anunciou ainda a possibilidade de injeção na rede elétrica de serviço público de toda a produção dos centros eletroprodutores eólicos existentes, sem limitações administrativas de modo a aproveitar toda a produção possível que tem como objetivo maximizar a capacidade produtiva do país.

“Estamos a remover essas limitações administrativas com efeito imediato”, declarou.

António Costa afasta aumento de rendimentos

No sábado, o secretário-geral do PS deixou, no entanto, o aviso de que um aumento imediato dos rendimentos como resposta à espiral inflacionista iria ser “comido rapidamente” pela consequente subida de preços, tal como aconteceu nos anos 70 e 80.

“Temos de travar a inflação e não disseminar a inflação, gerando uma espiral inflacionista”, declarou António Costa na intervenção que proferiu na abertura da reunião da Comissão Nacional do PS e que dedicou sobretudo aos efeitos económicos provocados pela invasão militar da Rússia na Ucrânia.

Ao longo de mais de dez minutos, o líder socialista destacou o conjunto de diplomas que visam a contenção do aumento dos custos da energia e do agroalimentar e que foram aprovados na sexta-feira à noite em reunião extraordinária do Conselho de Ministros.

Neste ponto, o atual primeiro-ministro recusou o caminho proposto por algumas forças políticas, sobretudo as que estão à esquerda do PS, dizendo que não vai “embarcar na ilusão de que se aumenta o poder de compra e se combate a inflação só por via da subida dos rendimentos”.

“Todos os que viveram nos anos 70 e 80 se recordam [das consequências] de responder unicamente com aumento dos rendimentos ao aumento dos preços. Se os preços estão a aumentar porque os custos de produção estão a subir na área da energia, então, por essa via, iríamos só aumentar mais os custos de produção. Os preços iriam aumentar e cairíamos na ilusão do aumento do rendimento, que rapidamente seria comido pela subida da inflação”, sustentou.

Madremedia