O escritor moçambicano Mia Couto afirmou hoje que vai contactar outros vencedores do Prémio Camões para tomarem uma posição conjunta contra a indicação do Presidente brasileiro Bolsonaro de que poderá não assinar o diploma do prémio a Chico Buarque.
Em entrevista à Lusa, o escritor moçambicano, vencedor do Prémio Camões em 2013, disse que mal tomou conhecimento das declarações de Jair Bolsonaro, foi imediatamente assaltado pela vontade de tomar uma atitude.
Na quarta-feira, o Presidente brasileiro deu a entender que não assinará o diploma do Prémio Camões concedido ao compositor e escritor Chico Buarque, afirmando aos jornalistas que assinaria “até 31 de dezembro de 2026”, data que remete para o final de um segundo mandato presidencial, caso fosse reeleito em 2022.
Em resposta, Chico Buarque afirmou que uma eventual não assinatura de Bolsonaro do diploma era para ele “um segundo Prémio Camões”.
Comentando o sucedido, Mia Couto começou por “saudar” a resposta do músico e escritor, considerando-a “genial”, afirmando de seguida a sua intenção de contactar os “colegas que foram Prémio Camões” para fazerem uma “declaração conjunta contra a imbecilidade desse tipo de atitude”.
“Soube hoje [desse episódio], e a minha ideia é – como eu não posso fazer isso sozinho – pedir ao secretariado do Prémio Camões que me dê os contactos das pessoas de maneira que a gente tenha uma postura conjunta”.
A justificação do escritor é não só a “ligação muito particular” que tem com Chico Buarque, mas sobretudo o sentir que “é o Prémio Camões que está a ser agredido, a liberdade de criar”.
“Ficarmos calados seria uma coisa inaceitável, por isso vou telefonar a saber se o secretariado do Prémio Camões me pode ajudar a contactar, e fazermos um manifesto conjunto contra isso”, reiterou.
A este propósito, Mia Couto lamentou a situação política e cultural vivida atualmente no Brasil, país de onde regressou recentemente e onde foi distinguido com o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Brasília.
“Eu venho do Brasil e venho muito preocupado com essa subida de tom do lado autoritário da censura, a maneira como os livros estão a ser retirados das escolas, uma coisa completamente anti-ética. Não é só o Bolsonaro, estava ali um Brasil fabricado pela igrejas evangélicas, de que não dávamos conta”, afirmou à Lusa.
Como exemplo, contou a história de uma escola que visitou, em que “os pais mandaram retirar um livro infantil do Jorge Amado, porque tinha uma ilustração em que aparecia uma vaca e se viam as tetas da vaca”.
“A gente pode pensar que é o Jorge Amado, que querem agredir o Jorge Amado, mas não. É uma coisa tão idiota que não tem limite”, considerou, acrescentando: “É assustador porque apela a coisas tão primárias, tão fora daquilo que a gente pensa, que já passámos essa página”.
Lusa / Madremédia
*com agências