O Presidente da República assinalou em Luanda o luto nacional de hoje pelas vítimas da violência doméstica, reiterando que Portugal tem um problema de cultura cívica a enfrentar, que abrange setores -chave.
Marcelo Rebelo de Sousa promulgou no início deste mês o decreto do Governo que declara luto nacional de um dia pelas vítimas de violência doméstica, hoje, 07 de março, declarando-se convicto de que, “mais do que mero ato simbólico”, esta iniciativa “significa maior mobilização nacional, incluindo todos os órgãos de soberania, no combate a este flagelo”.
Na quarta-feira, em Luanda, onde iniciou uma visita de Estado a Angola, o chefe de Estado fez questão de assinalar este dia de luto, durante uma aula-debate na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, afirmando que “é uma chamada de atenção, é simbólico, mas a ideia é mobilizar as pessoas”.
“Portugal terá um dia de luto nacional precisamente como protesto pelo facto de, nos primeiros meses deste ano, termos assistido ao que aparenta ser, e espero que não seja, uma escalada em termos de violência doméstica, e concretamente de violência sobre mulheres”, referiu.
Em seguida, lançou uma pergunta aos alunos de direito: “Isso depende das leis, depende do direito ou depende da consciência das pessoas, ou depende da cultura cívica?”. E deu a resposta: “Eu não vos escondo que a cultura cívica é muito importante”.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, “pode haver as melhores leis, e é bom que haja leis que previnam e que reprimam, e que haja instituições que o façam, à medida das leis”, mas é fundamental alterar “a cultura cívica dominante”, quando esta constituir, “ao menos em setores-chave, em setores fundamentais, uma cultura que crie condições para achar natural a violência doméstica”.
“Porque aquilo que se passa, do ponto de vista dessa posição cultural, não é violência doméstica, é tradição, é uma realidade justificada das formas mais variadas. Enquanto isso existir, é evidente que não são dados passos significativos em matéria de combate à violência doméstica”, considerou.
Trata-se de “um fenómeno cultural”, acrescentou o Presidente da República, concluindo que “por isso o debate cultural é importante, e por isso não pode haver tabu, e por isso não pode haver complexos. O tema tem de ser, não só debatido, como criar-se a noção da necessidade de mobilizar as pessoas para mudar aquilo que está errado”.
No dia 12 de fevereiro, durante um encontro sobre “A mulher, hoje”, na Aula Magna, em Lisboa, sem mencionar nenhum caso concreto, o chefe de Estado manifestou-se contra “a aceitação ou a legitimação da violência contra a mulher porque é mulher” e defendeu que é necessária uma “mudança de cultura cívica, que deve anteceder e dar plena eficácia às leis”.
Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa sustentou que a cultura cívica em Portugal propicia a discriminação negativa das mulheres na justiça e a “chocante” desigualdade salarial face aos homens.
“Não é sequer preciso ser-se defensor de uma posição doutrinária de género para se condenar omissões, minimizações, fundamentações justificativas claramente contrárias à dignidade da pessoa humana”, reforçou.
No dia 22 de fevereiro, o Presidente da República assinalou o Dia Europeu da Vítima do Crime e pediu ação urgente face às “tristes notícias sobre o brutal aumento da violência doméstica, do qual já resultaram 12 mortes trágicas”.
“Apelo, por isso, para que toda a sociedade portuguesa se mobilize e se envolva numa profunda mudança cívica nacional, cuja ação seja a da inversão rápida desta perturbadora tendência”, escreveu, numa mensagem divulgada no portal da Presidência da República na Internet.
Lusa