Banco de Portugal ordenou que cerca de €2 mil milhões em obrigações seniores passem do Novo Banco para o BES. Investidores institucionais podem perder tudo. Obrigacionistas de retalho estão salvaguardados.
O Novo Banco precisava de €1,4 mil milhões em capital e alguém tinha de pagar a conta. O Banco de Portugal decidiu que essa seria suportada pelos detentores de dívida sénior, que até agora fazia parte do balanço do Novo Banco.
Ao abrigo da medida de resolução que previa a possibilidade de o regulador do sistema financeiro transferir ativos entre o Novo Banco e o BES a qualquer altura, foi determinado esta terça-feira que as obrigações seniores, aquelas que em caso de falência são pagas em primeiro lugar, emitidas pelo BES entre 2010 e 2013 vão transitar do Novo Banco para o “banco mau”.
Em comunicado divulgado esta terça-feira à noite, o Banco de Portugal diz que “esta medida é necessária para assegurar que os prejuízos do BES são absorvidos em primeiro lugar pelos acionistas e pelos credores daquela instituição e não pelo sistema bancário ou pelos contribuintes”.
O supervisor acrescenta que “a seleção das referidas emissões fundamentou-se em razões de interesse público e teve em vista salvaguardar a estabilidade financeira e assegurar o cumprimento das finalidades da medida de resolução aplicada ao BES”. Além disso, a medida protege “todos os depositantes, os credores por serviços prestados e outras categorias de credores comuns”. E “não afeta as obrigações abrangidas pelos acordos celebrados entre o Novo Banco e os seus clientes”.
Com esta medida, o Novo Banco deixa de necessitar de qualquer aumento de capital adicional e evita que a partir do próximo ano, e em caso de intervenção no banco, o dinheiro dos depositantes pudesse estar em risco. Do mesmo modo, os contribuintes ficam protegidos, já que o Estado, único acionista do Novo Banco via fundo de resolução, não precisará de injetar mais dinheiro na instituição.
O Banco de Portugal diz que “desta medida resulta, em termos líquidos, um impacto positivo para o capital do Novo Banco de cerca de 1985 milhões de euros”.
De acordo com o que foi possível apurar pelo Expresso, esta medida permitirá colocar o rácio de capital do banco em quase 13%. Isto porque os ativos do banco não são alterados mas a dívida desce em quase €2 mil milhões. A medida irá também permitir aumentar consideravelmente o preço de venda do Novo Banco.
O Expresso sabe que foi equacionada a possibilidade de transformar estas obrigações em capital, ou seja, os detentores da dívida passavam a ser detentores de ações do Novo Banco. Contudo, esta possibilidade acabou por ser afastada porque iria no futuro diminuir o encaixe com a venda do NB.
O Banco de Portugal decidiu também que a partir desta altura deixa de poder haver alterações ao ativos do Novo Banco, ou seja, que a discricionariedade de transferir ativos entre o Novo Banco e o BES deixa de existir. Esta medida fecha assim definitivamente o perímetro de venda do Novo Banco.
LITIGÂNCIA À VISTA
Quem não vai receber bem esta decisão são os detentores destas obrigações do BES, que podem perder todo o seu investimento. Na sua grande maioria são investidores institucionais internacionais que apostaram em dívida daquele banco entre 2010 e 2013 em unidades de participação de 100 mil euros. Estes produtos podem ser comprados por investidores de retalho, mas só no mercado secundário, e o Expresso sabe que apenas 1% destas obrigações deverá estar nas mãos de particulares.
Esta decisão é em tudo igual à que foi tomada no final de 2014 em relação ao investimento da Oak Finance (Goldman Sachs) e que acabou por levar a um processo do banco de investimento contra o Banco de Portugal, que está a ser julgado em Londres. Uma fonte contactada pelo Expresso garante que a litigância vai ser enorme também neste caso, mas que futuras indemnizações serão da responsabilidade do fundo de resolução e não do Novo Banco, o que protege o valor do banco.