15.05.2025 –
No passado sábado, no âmbito da Semana Ibérica sobre Espécies Invasoras, teve lugar em Mira a iniciativa “Na Mira das Invasoras”, uma jornada de ação e sensibilização e de educação ambiental e cultural, que reuniu interessados e especialistas no controlo ecológico da acácia-de-espigas – Acacia longifolia, a espécie invasora terrestre mais abundante nas dunas e pinhais costeiros desta região.
O destaque foi para a observação e monitorização do inseto-da-galha da acácia-de-espigas – Trichilogaster acaciaelongifoliae, um pequeno himenóptero que começou a ser introduzido nesta região há cerca de três anos como agente de luta biológica. A sua função é específica: impedir a produção de sementes da Acacia longifolia ao formar galhas nas suas gemas florais — um processo inócuo para as restantes espécies vegetais e animais, incluindo o ser humano.
A luta pela biodiversidade e nova labuta proposta para as dunas
O evento contou com a presença dos investigadores Liliana Neto Duarte e Francisco Alejandro Lopéz Nuñes, que integram a equipa de monitorização nacional do projeto. Durante a manhã, os participantes percorreram a duna primária a sul do aglomerado da Praia de Mira, onde observaram a presença das galhas, avaliando a sua densidade e distribuição, bem como da diversidade florística local.
Foi também realizado um exercício de remoção simbólica de chorão-das-praias – Carpobrotus edulis – numa área de cerca de 25m², junto ao caminho de acesso ao esporão da Praia de Mira, mostrando o impacto da ação direta no controlo de invasoras. Estas ações não pretendem retirar esta invasora das dunas, mesmo porque contribuem na fixação das areias, mas somente controlar a sua expansão e dar espaço à biodiversidade.
Num troço de monitorização que os cientistas realizaram, entre Aveiro e Figueira da Foz – Rota das Galhas, confirmaram que o inseto tem vindo a se expandir com sucesso desde a sua introdução. Contudo, advertem que ao longo das matas e perímetros florestais, Sítio Natura 2000 – Dunas de Mira, Gândara e Gafanhas, em especial nos locais percorridos pelo grande incêndio de 2017, desenvolvem-se extensos acaciais mistos que se apresentam como um desafio para os próximos anos. Concluem: “Haja coragem e paciência!”
Ecossistemas protegidos: restaurar e priorizar
Ainda durante a manhã, procedeu-se à avaliação da qualidade ambiental em alguns habitats dunares próximos da linha de costa, destacando-se as “dunas móveis litorais ou dunas brancas”, as “dunas fixas com herbáceas ou dunas cinzentas” e as “dunas fixas descalcificadas atlânticas”, onde surgem espécies arbustivas e arbóreas, dominadas por pinhais e acaciais.
Nesses habitats visitados, classificados como prioritários pela Rede Natura 2000, encontraram-se plantas autóctones relevantes para a restauração ecológica dos habitats dunares. Entre herbáceas, arbustivas e arbóreas autóctones, identificaram-se e elencaram-se algumas espécies de grande interesse para a biodiversidade local: sabina-da-praias – Juniperus phoenicea; camarinha – Corema album; verbasco-das- areias – Verbascum litigiosum; narciso-das-areias – Narcissus bulbocodium; salgueiro-das-areias – Salix arenaria; samouco – Myrica faya e pinheiro-manso – Pinus pinea, entre outras adaptadas às condições extremas das dunas e vitais para a manutenção dos serviços ecológicos da paisagem e conservação da biodiversidade.
Os investigadores reforçaram que, para que estas espécies possam recuperar terreno, é crucial a remoção ativa de invasoras, como a acácia-de-espigas e o chorão-das-praias, entre outras, permitindo espaço e condições para a regeneração de plantas nativas, seja ela natural ou introduzida.
Palestra e esclarecimento de receios
Já ao início da noite, o Centro Interpretativo da Casa e Cultura Gandaresa, no Seixo, acolheu uma palestra orientada pelos investigadores, que atraiu uma sala cheia de interessados. Foram debatidas as estratégias de controlo biológico, os mitos e receios associados ao uso do inseto-da-galha e esclarecidas dúvidas sobre o impacto no ecossistema e na saúde pública.
Foi desmistificada a ideia de que esta intervenção possa conduzir à extinção da Acacia longifolia: o banco de sementes desta espécie no solo é demasiado abundante e será prontamente ativado/germinado por eventos de perturbação como incêndios ou alterações de humidade. A luta biológica visa apenas reduzir drasticamente a produção de novas sementes, controlando a propagação sem erradicar por completo a planta ou a espécie, e não tem qualquer efeito sobre outras plantas, animais ou sobre o ser humano, como comprovam todos os estudos de laboratório e de campo realizados até à data, em Portugal e no estrangeiro.
Iniciativas como “Na Mira das Invasoras” são fundamentais para informar e envolver a população nas questões ecológicas que afetam diretamente os nossos territórios. Ao conjugar ciência, ação no terreno e diálogo com a comunidade, contribuem para desfazer mitos, criar consciência ambiental e preparar o caminho para decisões mais informadas, responsáveis e eficazes no combate e controlo das espécies invasoras. Só com conhecimento partilhado e participação ativa será possível restaurar e proteger as nossas espécies e os nossos ecossistemas, para benefício de todos — presentes e futuros.