A Tilray é uma empresa da indústria farmacêutica com sede no Canadá, British Colombia. Fundada em 2013, foi a primeira empresa do género a entrar na bolsa de valores americana NASDAQ. Está associada à produção e tratamento de produtos baseados na Cannabis. Obviamente, não falarei desta empresa por si, mas sobre o impacto que tem para Cantanhede e as consequências deste crescimento evidente. Esta empresa, que ainda está em processo de arranque, mas já em funcionamento parcial, pretende empregar mais de 150 trabalhadores, dos mais diversos graus académicos e origens. Como esta, outras empresas que estão neste momento a instalar-se nas zonas industriais do município, também estão em expansão e, por isso, a contratar e a trazer mais emprego para Cantanhede. Atualmente, o Município apresenta um saldo de capital derivado das exportações consideravelmente superior ao das importações – dos maiores da Comunidade Intermunicipal. Isto é muito positivo e deve ser salientado de facto.
Questão: E como vamos aproveitar todo este vento de otimismo?
Infelizmente, na minha opinião, não vamos. É minha obrigação e vontade elogiar o forte trabalho feito na procura do desenvolvimento das zonas industriais, que de facto foi bom. As nossas zonas industriais estão a crescer a um ritmo invulgar com empresas sólidas e de boas garantias. O problema surge em tudo o resto.
Obviamente que começar por falar destas empresas seria apenas para contextualizar a urgência (possivelmente, já não em tempo útil) de “construir cidade”. Vejamos então, pragmaticamente:
Este surto de emprego está a causar vontade de fixação de residentes no município, principalmente na cidade. Estamos prontos? Não.
Isto deve-se à falta de visão geral de futuro. O foco nas zonas industriais foi bom de facto, no entanto, tudo o resto que terá que estar pronto para que a cidade (principalmente) cresça de forma sustentável não irá estar. Isto porque não existe um rumo, uma visão, uma perspetiva de longo prazo que defina o que vai ser Cantanhede em 2030, por exemplo (faltam apenas 11 anos) para não falar em 2050. Quando falamos em Planeamento Urbano e Territorial, a escala de tempo associada é a geração, que neste caso, económica e sociologicamente corresponde a períodos de 25 anos. Ora, Cantanhede nem daqui a 5 anos sabe como vai estar. Isto é gravíssimo. A última visão que tive a oportunidade de ver foi a de 2005, na altura Jorge Catarino era Presidente da Câmara. Este plano, embora megalómano, existia e esse seria o primeiro passo para definir o rumo das coisas. Clara está que tal plano deveria ser sujeito a escrutínio e apreciação da comunidade residente, mas não deixa de ter mérito, simplesmente por existir. Hoje, não existe. Não há plano. O Município vai sendo feito, conforme vai dando. Não será da opinião de todos, que seria muito mais válido se todos soubéssemos para onde estamos a ir e qual o nosso rumo? Não seria muito mais tranquilizante se tivéssemos uma base sustentável de futuro na qual no pudéssemos basear, mesmo que com as alterações necessárias e próprias das dinâmicas de um município? Pois bem, não existe. Esta minha urgência em partilhar este assunto tem que ver também com o facto de que para criar esse rumo, seria necessário fazer muito trabalho e investimento interno (aquele que o munícipe/eleitor não vê), mas que é tão ou mais importante como aquele que se vê (obras públicas, estradas, ciclovias, auditórios, largos, etc.). Para vos pôr a par daquilo que falo, faço aqui uma pequena exposição: O município rege-se por um plano geral, chamado Plano Diretor Municipal. Neste plano, na carta de Ordenamento encontramos a classificação do solo, que o define, entre outras variáveis, como urbano, rural ou urbanizável. Ou seja, todo o solo do município está classificado com um destes três elementos. E qual é então a questão aqui? Um dos problemas é que, após sucessivos adiamentos por parte do Governo, os solos urbanizáveis ficarão extintos em 2020 (daqui a pouco mais de um ano). A consequência disto será que os perímetros urbanos ficarão fechados e o território ficará apenas classificado como rural ou urbano. Logo, a expansão urbana deixará de existir e por isso as nossas vilas e cidade não poderão crescer mais.
Voltando atrás no assunto, percebem onde quero chegar quando falo no aumento do emprego e da procura da habitação. A única hipótese de estes referidos solos urbanizáveis não ficarem extintos seria através de obras de infraestruturação (estradas e redes). Ou seja, a Câmara Municipal tem apenas um ano para construir todas as estradas e coletores que estariam projetados para que se assegurasse o crescimento. Claro está que isto não vai acontecer, até porque estas infraestruturas não estão convenientemente projetadas.
Voltando, novamente, ao assunto do rumo de Cantanhede, aparecem-nos pequenos sinais da falta deste rumo, alguns deles já abordados por mim em intervenções públicas anteriores. Se repararem nas obras que têm sido feitas por aí, é evidente a falta de visão. As estradas que são refeitas, não durarão 15 anos, isto porque hoje já foram construídas sem a visão de acessibilidade e mobilidade que HOJE é necessária, mas que daqui a 15 anos será obrigatória. Estas “novas” vias, dentro de poucos anos estarão novamente em obras. Imaginemos então que teríamos a tal visão de futuro. Não seria lógico que as intervenções recentes na Rua Marquês de Pombal originariam uma obra muito mais interessante do ponto de vista do espaço público e da mobilidade? Numa outra intervenção passada, abordei a questão da ciclovia, pois esta não estará, nem de perto, própria para as viagens pendulares dos ciclistas. A ciclovia que neste momento está em construção na cidade de Cantanhede não está projetada para quem deseje deslocar-se nas suas viagens pendulares de bicicleta. As pessoas que o fazem, certamente concordarão comigo. Em Reunião de Câmara, aquando da aprovação da empreitada da ciclovia, deixei claro que era a favor da construção de ciclovias, mas que claramente não seria por ali. Como estes casos há vários do ponto de vista urbano que revelam a falta de visão estratégica, visão essa que já me disponibilizei por várias vezes a contribuir para que o seu processo fosse o melhor possível e com mais intervenientes. Vivemos numa Era Global, onde se conhece tudo em todo o lado. Não será tempo de por os olhos em cidades, municípios, vilas e metrópoles diversas e aprender com todos os erros que elas já cometeram? Mais facilmente os evitaríamos. Não será altura também de aprender com os municípios portugueses vibrantes e de forte desenvolvimento ambiental, cultural, demográfico e urbano? Reinterpretar algumas das suas medidas e reajustá-las à nossa realidade?
Falarei também da questão cultural e comercial do município em breve.
Em suma, a Tilray é uma mais-valia para o nosso Município. Não a desperdicemos, por favor.
Gonçalo Magalhães