“Nem o PS e muito menos o PSD/CDS estão disponíveis para retirar Aveiro do Programa de Ajustamento Municipal que não é nada mais que uma versão à escala local da política de austeridade desastrosa dos anos da Troika”
Palavras de João Moniz em entrevista ao jornal Miraonline
Dirigente do Bloco de Esquerda em Aveiro como vê o trabalho realizado pelo partido quer no concelho, quer no distrito?
Uma das principais características do trabalho que as e os ativistas do Bloco em Aveiro, é o facto de estarmos em todas as lutas sociais no Concelho e no Distrito. Deste contacto directo com a população, posso destacar alguns episódios importantes. Fomos o único partido, que na semana em que os transportes públicos foram concessionados a privados em Aveiro, percorreu todas as linhas nos horários mais problemáticos, nomeadamente das 6 e 7 da manhã.
Por causa desta concessão, muitas pessoas ficaram sem conseguir ir para os empregos, ou impedidos de aceder aos serviços como a segurança social ou o centro de saúde. Foi uma decisão desastrosa por parte do executivo PSD/CDS da Câmara Municipal de Aveiro (CMA) que só beneficiou a multinacional Transdev que ficou com a concessão.
Outro exemplo forte, entre muitos outros em questões como o urbanismo ou a austeridade municipal do executivo de Ribau Esteves, é a luta por um canil municipal que o Bloco em Aveiro tem acompanhado e fizemos varias sessões
A forma como construímos as nossas listas aos órgãos autárquicos é um espelho dessa realidade. Naquelas listas estão, não só aderentes do Bloco, como também pessoas da sociedade civil empenhadas na defesa na devolução dos transportes públicos à cidade, ativistas contra a precariedade, sindicalistas, pessoas dos movimentos e associações dos direitos e bem-estar animal.
Esta solidariedade que as e os ativistas do Bloco encaram as lutas sociais em Aveiro é depois complementado por um trabalho politico muito intenso na Assembleia Municipal, onde o Bloco, apesar de na ultima legislatura só ter um único eleito – e que agora nas ultimas autárquicas foi reforçado em dobro, foi de longe o partido que mais propostas faz nesse órgão. Apresentamos 15 propostas ao longo de quatro anos enquanto todas as outras forças políticas combinadas apenas apresentaram 2 propostas.
Foi candidato á Assembleia de Freguesia de Esgueira. Os seus projetos para a freguesia não foram entendidos em pleno, pese embora ter sido eleito. O que correu mal? Em seu entender porque é que a mensagem não passou no seu todo?
O balanço que faço dos resultados eleitorais obtidos pelo Bloco quer em Esgueira quer nos outros locais onde concorremos, é muito positivo. Essencialmente demonstram uma grande capacidade de alargamento do espaço do Bloco, conquistado pela solidariedade com as lutas sociais travadas no município, e por um historial de trabalho político eficaz e intenso por parte de todas e todos os eleitos do Bloco, e por um programa feito de propostas concretas que dão resposta às necessidades da população. Foi um resultado sem precedentes no município onde elegemos pela primeira vez em varias freguesias e duplicamos a nossa presença na assembleia municipal. O espaço do Bloco cresceu em Aveiro.
No que concerne especificamente em Esgueira onde fui o primeiro candidato, penso que o resultado foi bom. Passamos a ter um eleito onde no passado não tínhamos. E essa situação, com certeza que irá exponenciar a presença no Bloco na freguesia. Vamos ter a capacidade de apresentar propostas que vão ao encontro das necessidades da população em áreas como os apoios sociais, mobilidade e transportes, protecção do ambiente e requalificação dos espaços verdes e urbanos. No entanto, os resultados que obtivemos também nos dizem que há muito que fazer no futuro, mas penso que o Bloco tem tudo para crescer em Esgueira.
Outros candidatos do Bloco também foram eleitos, quer para a Assembleia Municipal, quer para as assembleias de Cacia, Eixo e Eirol, Glória e Vera Cruz e Santa Joana. O Bloco está a crescer. Acha que fruto do trabalho realizado e a realizar as coisas podem mudar para melhor?
Respondendo diretamente à pergunta – com certeza que sim. No início da entrevista, aludi ao enorme trabalho politico que o Bloco tem vindo a apresentar no mandato transato. Estamos a falar de um total de 15 propostas em sede de Assembleia Municipal, quando as outras forças políticas combinadas só apresentaram 2 propostas ao longo dos últimos 4 anos. E tínhamos um único eleito naquele órgão.
Agora, após o resultado de 1 de outubro passamos de 2 eleitos, um na Assembleia Municipal e uma na Freguesia da Glória e Vera Cruz, para um total de 7 mandatos nos órgãos que referiu na pergunta. É com esta força multiplicada e intensidade de trabalho do passado que olhamos para os próximos 4 anos. Sinceramente acho que faremos a diferença para a vida das pessoas em Aveiro com a nossa força e com as nossas propostas.
Quais os problemas que vê no concelho de Aveiro e que os autarcas dos grandes partidos não resolveram?
No âmbito autárquico em Aveiro a resposta é clara. Em primeiro lugar nem o PS e muito menos o PSD/CDS estão disponíveis para retirar Aveiro do Programa de Ajustamento Municipal que não é nada mais que uma versão à escala local da política de austeridade desastrosa dos anos da Troika. Este plano impõe aos nem Aveirenses taxas municipais e IMI nos valores máximos para os próximos 20 anos. É um autêntico saque fiscal autárquico que tem que ser revertido o mais rápido possível. Esta foi uma opção desnecessária para resolver o problema da divida do município. É uma má solução já que empurra a dívida dos atuais detentores para um fundo público, o FAM. É importante relembrar que o PS votou favoravelmente este plano de austeridade municipal.
Para além deste saque fiscal autárquico, é imperioso que a concessão dos transportes públicos no município à multinacional Transdev seja revertida. Estamos a falar de um negócio feito à medida do concessionário, e a preguiço dos Aveirenses que necessitam de um serviço público de transportes para poder conduzir os seus assuntos quotidianos. Está concessão representa uma penalização aos munícipes em varias frentes – não só ficamos com um muito pior serviço de transportes com uma redução brutal de horários e carreiras paga a preços mais elevados do que se praticava anteriormente, uma subida de cerca de 20%.
Para agravar a situação a autarquia predispõe-se ao pagamento de 60 cêntimos por quilómetro percorrido, que inclui os quilómetros feitos em vazio. Para não falar que esta concessão nada abona a favor dos trabalhadores da antiga empresa de transportes públicos que se viram obrigados a transitar para a empresa concessionária perdendo muitos direitos laborais e de antiguidade.
Como pode imaginar, esta situação é totalmente insustentável e não existe vontade política suficiente por parte do PS em Aveiro para fazer o que é necessário – a total reversão deste jackpot para a Transdev. Para nós a situação é bem clara. Além da reversão e regresso da gestão dos transportes para a esfera pública, defendemos um serviço intermunicipal de transportes e maior cobertura. Pensamos que as externalidades positivas de ter um serviço público de transportes alargado e que servi as necessidades da população (diminuição do tráfego automóvel, da manutenção das estradas, dos lugares de estacionamento, da poluição, dos acidentes automóveis, etc.) mais que compensa os custos de gestão.
Do ponto de vista nacional, o que é que mais o incomoda na política?
A influência desmedida que os grandes grupos económicos têm sobre as decisões políticas. Este problema ficou exposto a nu, recentemente com a cambalhota dada pelo PS quanto à proposta do Bloco para acabar com as rendas excessivas das elétricas. O que aconteceu foi claro – o PS preferiu responder as suas clientelas do grande poder económico em detrimento de salvaguardar os bolsos dos portugueses.
Estamos a falar de uma empresa, a EDP Renováveis que com apenas 12% da sua produção em território nacional, a empresa obtém em Portugal 27% dos seus lucros. Quem vive do seu trabalho paga a mais cerca de 400 milhões de euros por ano pela produção renovável do que pagaria aqui ao lado em Espanha. Em suma, a EDP não gostou e o PS vergou-se, e quem fica a pagar mais somos todos nós.
A corrupção e a falta de transparência, os atentados ambientais, o trabalho precário, são alguns dos cancros da nossa sociedade. Na sua opinião, como dirigente do Bloco de Esquerda, como mestre em Ciência Política, que se pode fazer?
Eu diria que a melhor arma contra estes problemas, não só agora como no passado, é a mobilização popular. Se olharmos para a história, todos os avanços civilizacionais foram conquistados pela via da auto tomada de consciência e subsequente mobilização das camadas menos privilegiadas da sociedade contra opressões, injustiças, etc.
De certeza forma, tivemos um exemplo recente disto que estou a falar quando o governo Passos/Portas foi derrotado e obrigado a recuar na sua proposta de diminuir a contribuição dos patrões – a chamada Taxa Social Única (TSU). Após milhares de portuguesas e portugueses se terem organizado em protestos massivos em varias cidades do país, sem precedentes na historia recente do país, os protestos organizados pelo movimento Que se Lixe a Troika. O que momentos como este demonstram é que, de facto, quando o povo se organiza e se mobiliza, é em quem mais ordena.
Cabe depois aos partidos políticos de esquerda, progressistas e socialistas serem condutas onde as várias lutas sociais emancipatórias se encontram e se convertem em programas políticos concretos de transformação radical da sociedade. Em suma, tornar o que é particular e contingente em universal. A melhor forma de transformar a sociedade para melhor é participar ativamente nas lutas sócias que nos são próximas e relevantes, como a luta pela dignificação do trabalho, pela defesa da igualdade de género ou pelas causas ambientais e posteriormente participar e militar em partidos que se vinculem nos ideais de emancipação e progresso como o Bloco de Esquerda.
António Veríssimo