Dois anos depois da tempestade Leslie, associações anseiam pelos apoios prometidos pelo Governo

Associações, coletividades e outras entidades do setor social somaram avultados prejuízos aquando da passagem da tempestade Leslie pela região Centro. Mas, de 2018 até hoje, ainda continuam à espera dos apoios prometidos pelo Governo.

Dois anos após a passagem da tempestade Leslie, os apoios no setor agrícola já estarão executados quase na sua totalidade, os municípios já receberam parte do apoio financeiro do Estado, ainda que com críticas à falta de celeridade, mas é no setor social que o processo está mais atrasado, não tendo ainda sido celebrado qualquer contrato de financiamento com o Estado.

Na Casa do Povo da Abrunheira, em Montemor-o-Velho, parece que a tempestade não passou por lá – pelo menos olhando de fora para os edifícios onde funcionam os três lares com 100 utentes desta instituição.

José Carvalho, presidente da instituição, convida à entrada e, logo no auditório, dá para ver as marcas da Leslie, em que parte do teto falso caiu.

Sobe-se ao primeiro andar e vê-se a solução provisória – uma cobertura, ainda sem teto falso, que deixa a descoberto as vigas de madeira, que suportavam o antigo telhado, que cedeu à passagem dos fortes ventos que se fizeram sentir ali.

Pelo chão, espalham-se objetos e equipamentos, guardados com lonas. Computadores, que ficaram estragados, e os troféus da instituição que se conseguiram recuperar, também se vislumbram, mas há outros, mais leves, que foram com o vento, recorda José Carvalho.

Nesta instituição, da qual alguns idosos tiveram que sair dos seus quartos porque “ficaram à chuva”, os prejuízos rondaram cerca de 900 mil euros. Mais de 200 mil euros foram pagos pela cobertura do seguro, que permitiu construir uma nova cobertura e criar alguns remendos, informou este responsável.

No entanto, muitas das soluções são ainda provisórias, afirmou à agência Lusa José Carvalho, referindo que há quartos onde não podem pôr utentes porque “ainda chove lá dentro”.

Há dois anos que espera por apoios do Estado e ainda não tem qualquer indicação de quando é que esse pagamento irá chegar.

O apoio era para vir no ano passado e não veio. Esperou-se que entrasse no Orçamento do Estado de 2020. Em março, houve ordem da CCDR [Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional] para fazer os protocolos e aí até respirei fundo. Depois, veio o secretário de Estado suspender os contratos”, contou José Carvalho, que continua à espera do dinheiro, que, no caso da Casa do Povo da Abrunheira, serão cerca de 300 mil euros de investimento.

Questionado pela agência Lusa, o ministério da Modernização do Estado e Administração Pública referiu que a CCDR do Centro já concluiu o processo de validação e admissão, sendo que os contratos de financiamento estão dependentes da “disponibilização de dotação financeira para o efeito, que, nesta fase, se traduz em aproximadamente um milhão de euros, a investir até ao final do ano”.

Tal como a Casa do Povo da Abrunheira, muitas mais instituições na região Centro, especialmente no distrito de Coimbra, estão à espera dos apoios.

De acordo com a tutela, houve um total de 160 candidaturas de 17 concelhos afetados.

Na Associação Filarmónica União Verridense, também em Montemor-o-Velho, o telhado e a estrutura de teto falso caíram numa sala de preparação e onde funciona a escola de música.

Houve arranjos temporários, mas a solução, vinca o presidente da associação, Francisco Baptista, é “provisória”.

“O telhado é o que nos preocupa. A cada inverno que passa as coisas continuam iguais”, referiu, salientando que, naquela associação, o prejuízo estimado é de cerca de 18 mil euros e o seguro não cobriu a totalidade dos danos.

Para o presidente da Câmara de Montemor-o-Velho, Emílio Torrão, o Governo “tem que decidir rapidamente”, de forma a garantir que estas entidades tenham as suas situações resolvidas.

No caso da autarquia, já começou a receber apoio, mas o ritmo a que a verba é transferida é muito lento, notou.

“Os municípios vivem com orçamentos, em particular o de Montemor, com o dinheiro contado. Dos 545 mil euros investidos [pela Câmara], só ainda recebemos cerca de 132 mil euros [do Estado], de uma comparticipação de 60% de 775 mil euros. Torna-se muito difícil”, frisou.

Já na agricultura, onde os apoios começaram a chegar mais cedo, a situação é diferente.

Quem tinha as infraestruturas licenciadas, recebeu apoios do Estado. E quem tinha seguro de colheita, conseguiu ir buscar parte dos prejuízos.

“Os agricultores que não tinham seguro tiveram que suportar os prejuízos e estão a recuperar aos poucos”, afirmou à Lusa o presidente da Cooperativa Agrícola de Montemor-o-Velho, Armindo Valente, que conta com mais de 3.000 associados por todo o Baixo Mondego.

Apesar de o setor ter recuperado, isso não aconteceu sem mazelas, havendo casos de agricultores que tiveram de se endividar e outros que adiaram investimentos, como é o caso da própria cooperativa, referiu.

Se a maioria recuperou e continuou a atividade, nem todos tiveram a mesma sorte.

Tiago André, de 34 anos, tinha começado a produção de framboesas, em Santo Varão, localidade de Montemor-o-Velho, em 2017, recorrendo a fundos comunitários.

Quando a Leslie veio, estragou-lhe “todos os planos a longo prazo”, da sua vida “privada e profissional”, conta.

Com toda a produção destruída (cerca de 30 mil plantas) e com um empréstimo no banco de 100 mil euros para pagar, Tiago André assumiu logo de início que seria difícil retomar a atividade que há tão pouco tempo tinha começado.

Apesar de o setor ter recuperado, isso não aconteceu sem mazelas, havendo casos de agricultores que tiveram de se endividar e outros que adiaram investimentos, como é o caso da própria cooperativa, referiu.

Se a maioria recuperou e continuou a atividade, nem todos tiveram a mesma sorte.

Tiago André, de 34 anos, tinha começado a produção de framboesas, em Santo Varão, localidade de Montemor-o-Velho, em 2017, recorrendo a fundos comunitários.

Quando a Leslie veio, estragou-lhe “todos os planos a longo prazo”, da sua vida “privada e profissional”, conta.

Com toda a produção destruída (cerca de 30 mil plantas) e com um empréstimo no banco de 100 mil euros para pagar, Tiago André assumiu logo de início que seria difícil retomar a atividade que há tão pouco tempo tinha começado.

Desistiu, assim que soube que apenas poderia receber “no máximo” 70 mil euros do Estado para um investimento adicional de 150 mil euros para voltar a pôr a produção de pé.

Sem possibilidade de se endividar mais, rumou ao Luxemburgo para poder continuar a pagar ao banco o investimento que tinha feito.

Hoje, está a trabalhar no Alentejo, “com o peso das dívidas nas costas”.

“O Estado está cá para nos proteger e é para isso que pagamos impostos. Eu perdi todo o meu rendimento e não assumiram nada. Abandonaram-me”, lamentou o jovem.

Lusa