Da Gândara para o “mundo literário”: Eis António Canteiro… homem das letras!

Homem de gestos simples, postura calma, de palavras faladas com um sorriso tímido nos lábios e de palavras escritas como se de uma pintura se tratasse: cuidadosamente trabalhadas!

António Canteiro é, em suma, uma mescla de uma vivência aparentemente “trabalhosa” (é técnico superior de Reinserção Social, junto de reclusos do Estabelecimento Prisional de Aveiro) com a partilha da leitura da escrita desde tenra idade.

Hoje, aos 51 anos de idade, este escritor, nascido em São Caetano e que reside perto da sua terra, no Barracão, é merecedor de uma nota de deferência: é “reincidente” num prémio literário de renome, o “Alves Redol”, já que venceu este concurso de enorme prestígio… pela segunda vez!

O romance vencedor, que será publicado em breve, recebeu o título de “A luz vem das pedras”, mas este é apenas o mais recente galardão atribuído a António Canteiro. Dono, já, de um curriculum invejável, o escritor recebeu com a sua peculiar cortesia o Jornal Mira Online para uma conversa informal, deixando um pouco da sua alma numa curta entrevista, porém… esclarecedora!

“Ler bastante”… é assim que Canteiro define que deve ser o dia-a-dia de quem escreve (ele tinha dois livros na mala no momento da entrevista, e diz que lê sempre que o tempo o permite…). Para o autor “a escrita nasce da leitura. Assim “engravidamos”, de alguma forma, das palavras até que elas se tornem prontas a brotar sobre o papel”.

“Engravidamos das palavras”… eis uma definição que dá que pensar!

António Canteiro vai desfiando ideias, sempre com um sorriso meio tímido de quem ainda não se habituou à ideia de que é “famoso” no meio literário. Quem duvidar, que vá à página do Facebook da Editora Gradiva e vai encontrá-lo justamente abaixo de um dos maiores nomes da literatura mundial e que recentemente, nos deixou: Umberto Eco! Afirma, quando questionado de qual será a sensação de usar a palavra “fim” num livro, que é “agradável”, mas que sempre achou que o livro é “um produto que precisa de ser certificado. Daí, o objetivo de, ao terminar de escrever um romance, enviá-lo a um júri”. Talvez seja uma auto-defesa do autor que pretende, com este gesto, confirmar a qualidade que procura colocar nos seus textos…

Perfeccionista, Canteiro assume que sim… que se pode desistir de um livro, mas que “sempre aproveitamos algo nos próximos que vão aparecendo… Afinal, a escrita pode ser sempre reaproveitada, pois a arte de escrever nada mais é que construir a frase com beleza. Se assim não for, não será literatura, mas sim, informação, apenas!”

Quando questionado se segue alguma receita ao escrever, o autor diz que considera que um bom escritor ”deve ser original… deve fazer algo diferente do que já existe”. Para ele é necessário que se diga “o que está cá dentro de uma forma única, onde não se usa a linguagem comum do dia-a-dia”. Mais, diz que “o uso dos vocábulos novos é fundamental, daí a importância crucial da leitura sempre que possível, para que a escrita viva… é quase como dizer a si mesmo que aquilo que se escreveu é água de uma fonte, que jamais poderia ter sido escrito de forma diferente!”

Eis a prova de que tal é possível:

“Se me deres de beber dos teus lábios, sentirei o mel a que sabes

E mesmo de olhos vendados, há uma luz que me há-de levar

Sempre a ti…”

Desta forma, este é um pequeno “retrato”  do escritor António Canteiro. Sereno e dono de uma forma muito sua de usar as palavras e dançar com elas no papel, arrebatou outro prémio literário, desta vez, num universo de 263 (duzentos e sessenta e três trabalhos) de autores dos PALOP, o que lhe concede ainda mais mérito! E é este prémio que nos levou a entrevistá-lo. Não é, seguramente, mais importante que todos os outros, mas é mais uma prova do “amadurecimento” da escrita deste gandarês nascido e criado em terras pequenas, que tem por estes dias, o céu como limite…

 

Obras e prémios do autor:

2005 – “Parede de Adobo” (menção honrosa Prémio Literário Carlos de Oliveira)

2009 – “Ao redor dos muros” (venceu o Prémio Literário Alves Redol)

2011 – “Largo da Capella” (menção honrosa do Prémio Literário João Gaspar Simões)

2013 – “O silêncio solar das manhãs” (venceu o Prémio Nacional de Poesia Sebastião da Gama)

2013 – “Deitei a tarde pela janela e fiquei só” (menção especial do Júri no Prémio João José Cochofel/Casa da Escrita de Coimbra)

2015 – “Logo à tarde vai estar frio” (venceu o Prémio Literário Maria Amália Vaz de Carvalho)

2015 – “Na luz das janelas pestanejam as sombras” (venceu o Prémio Bocage)

2015 – “A luz vem das pedras” (venceu o Prémio Alves Redol) – ainda inédito

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