As disputas no comércio internacional estão sem árbitros a partir de hoje, perante o fim do mandato de dois juízes da Organização Mundial de Comércio, ficando sob “a lei da selva”, como a nova situação já foi designada.
O comissário europeu do Comércio, Phil Hogan, já anunciou que vai anunciar na quinta-feira propostas para a União Europeia continuar a fazer valer os seus direitos no comércio internacional.
O anúncio foi feito na terça-feira pelo porta-voz da Comissão Europeia, Eric Mamer, que enquadrou aquelas propostas na paralisação do órgão de apelo da Organização Mundial de Comércio (OMC) para resolver conflitos comerciais.
O bloqueio dos EUA a este órgão constitui um “golpe lamentável e muito grave para o sistema de comércio internacional baseado em normas, que durante os últimos 24 anos dependeram do órgão de apelo da OMC, e para a resolução de controvérsias em geral”, afirmou Hogan, em comunicado.
O órgão de apelo, formado habitualmente por sete juízes e que, desde 1995, tem a última palavra nos conflitos que os 164 países membros da OMC submetem ao seu juízo, vai deixar de estar operacional a partir de hoje.
Desde que Donald Trump chegou a presidente dos EUA, em 2017, que Washington se tem negado sistematicamente a aprovar a indicação de novos juízes para este órgão, pelo que nos últimos anos não se têm podido preencher as vagas que surgiam à medida que os juízes se retiravam — e já só restam três.
Em 10 de dezembro terminou o mandato de oito anos para dois dos juízes remanescentes — o indiano Ujal Singh Bhatia e o norte-americano Thomas Graham -, pelo que o órgão ficou reduzido a apenas um membro, a chinesa Hong Zhao, ficando asim paralisado, uma vez que é exigido um mínimo de três para funcionar.
Na opinião de Hogan, este é um momento “crítico” para o multilateralismo e o sistema global de comércio.
“Com o órgão de apelo eliminado da equação, perdemos um sistema de resolução de disputas funcional, que tem sido um garante independente, tanto para as grandes economias como para as pequenas, de que as normas da OMC eram aplicadas de forma imparcial”, sublinhou.
O comissário sublinhou que a UE “continua a apoiar firmemente o sistema multilateral de comércio” e acredita que uma OMC com um sistema eficaz de resolução de conflitos é “indispensável para garantir um comércio aberto e justo”.
Hogan advertiu que o mundo mudou nos últimos 24 anos e que a OMC “necessita de refletir as mudanças no seu contexto para continuar a ser relevante e operacional”.
Por isso, considerou fundamental concretizar um conjunto de reformas nas suas três principais funções, a saber, como produtor de normas comerciais, como monitor de políticas e práticas comerciais dos países e na resolução de conflitos.
Deixou ainda claro que a UE tem estado “à frente deste processo, fazendo propostas detalhadas e envolvendo-se de forma construtiva com os seus parceiros”, o que, prometeu, iria continuar a fazer.
Perante a iminente suspensão do órgão de apelo, recordou que a UE já propôs acordos temporários aos Estados que queiram continuar a resolver disputas de forma vinculativa e em respeito das normas da OMC.
Entre as disputas com apreciação suspensa estão sete casos apresentados contra a decisão tomada por Trump, em 2018, de declarar as importações de aço e alumínio estrangeiro uma ameaça à segurança nacional dos EUA e taxá-las fortemente.
Lusa