António Marto é o quarto cardeal português, depois de ter recebido das mãos do Papa Francisco o título, o anel e o barrete cardinalícios
Faltavam 20 minutos para as 16.00 desta quinta-feira quando, no altar da Basílica de São Pedro, no Vaticano, António Marto recebeu das mãos do Papa Francisco o título, o barrete e o anel de cardeal. O bispo de Leiria-Fátima tornou-se assim o quarto português a ter assento no Colégio Cardinalício, um dos dois que terão direito de voto na hora de escolher o sucessor de Francisco.
Na homilia dirigida aos novos cardeais, o Papa sublinhou o exemplo de Jesus que os deve guiar: é perante o “faminto”, o “esquecido”, o “recluso”, o “doente”, o “toxicodependente”, o “abandonado”, é perante as “pessoas concretas com as suas histórias e esperanças, com os seus anseios e deceções, com os seus sofrimentos e feridas” que os cardeais se devem inclinar.
É uma linha que António Marto adota como sua sem dificuldade, como confessou o próprio aos jornalistas, horas antes de ser criado cardeal. Declarando-se “apoiante do Papa, apoiante da reforma que o Papa quer levar para a frente, a reforma da Igreja”, citado pela agência Ecclesia, o bispo de Leiria-Fátima caracterizou essa reforma para “uma Igreja mais evangélica, menos burocrática, por exemplo, mais próxima das pessoas, mais acolhedora, de não exclusão, mais misericordiosa para com as situações de fragilidade, vulnerabilidade, mais atenta aos desfavorecidos, aos pobres, mais construtora de pontes”. Francisco não diria melhor. E Marto revelou que agradeceria ao Papa, dizendo-lhe de toda a sua “disponibilidade para o serviço” na reforma da Igreja.
D. António Marto junta-se agora a um grupo grande de gente que aconselha Francisco.
Carlos Azevedo. O homem dos bens culturais
Em fevereiro de 2013, já em Roma, Carlos Azevedo viu-se envolvido num (breve) escândalo, com a divulgação de um caso de alegado assédio a um padre do Porto. Depois de ter estado como bispo auxiliar de Lisboa, de 2005 a 2011, o atual delegado para os Bens Culturais do Conselho Pontifício da Cultura apontava o facto de “estas notícias” deverem “ser enquadradas no ambiente de preparação do Conclave e de sucessão do patriarca de Lisboa”. E, em maio de 2013, Manuel Clemente era nomeado patriarca da diocese da capital do país. Azevedo tem trabalhado na valorização da arte e do património. Sobre a elevação a cardeal de António Marto, D. Carlos Azevedo sublinhou o papel central de um outro cardeal, José Saraiva Martins.
Saraiva Martins. O cardeal que promoveu a diáspora
> O antigo responsável para as Causas dos Santos foi um promotor da diáspora eclesial portuguesa para Roma, como apontou o delegado pontifício dos Bens Culturais. Segundo Carlos Azevedo, o prefeito emérito daquela congregação, José Saraiva Martins, teve a “consciência” de se apostar na língua portuguesa na Cúria Romana e em “insistir que Portugal estivesse representado na Santa Sé”. O facto de, “nos últimos tempos”, nunca ter existido “uma presença tão significativa de portugueses a colaborar com a Santa Sé” deve-se “ao exemplo positivo e à insistência” deste natural da Guarda. Criado cardeal pelo Papa João Paulo II, em 21 de fevereiro de 2001, D. José Saraiva Martins resignou ao cargo de prefeito em 2009. Aos 86 anos, já não pode votar no sucessor de Francisco.
Monteiro de Castro. O outro cardeal que não pode votar
Manuel Monteiro de Castro, penitenciário-mor emérito, é o quarto cardeal português e porventura o mais discreto (Saraiva Martins tinha a vantagem de liderar a congregação que avalia os processos de beatificação e santificação). Fez grande parte do seu percurso eclesiástico no estrangeiro em nunciaturas apostólicas – desde 1967, em diferentes funções, passando por vários países da América Latina, África e também Europa (foi núncio em Espanha) – e em Roma. É pois um homem da Cúria. Natural de Guimarães, foi elevado a cardeal em 2012 por Bento XVI. Tem hoje 80 anos, ou seja também não poderá votar no próximo Papa.
Tolentino Mendonça. O novo arquivista e bibliotecário
> Na semana em que António Marto chegou a cardeal foi conhecida mais uma escolha pessoal de Francisco junto da Igreja portuguesa. José Tolentino Mendonça, acabadinho de ser indicado como diretor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica, acumulando com a vice-reitoria dessa instituição, foi nomeado pelo Papa como arquivista e bibliotecário da “Santa Igreja Romana”, elevando-o à “dignidade” de arcebispo. Poeta e padre, madeirense de origem, Tolentino Mendonça tem sido uma voz singular na poesia e na Igreja, tendo sido escolhido, em fevereiro deste ano, como orientador dos exercícios quaresmais do Papa Francisco, um retiro espiritual que antecede a Páscoa, e onde juntou textos que foram de Clarice Lispector aos evangelhos. Aos 52 anos, já é consultor no Conselho Pontifício da Cultura.
Avelino Bettencourt. O núncio que guiou Marcelo
Marcelo Rebelo de Sousa chegou ao Vaticano para a sua primeira viagem ao estrangeiro como Presidente da República para admirar a Pietà de Miguel Ângelo, para lá do vidro que protege a obra das multidões, e recolher-se junto do túmulo de João Paulo II, numa das capelas laterais da basílica. Foi acompanhado do então chefe de protocolo da Santa Sé, monsenhor José Bettencourt, que estava nessa função desde 2012. Hoje, José Avelino Bettencourt já não está no Vaticano, depois de ter assumido em abril o lugar de núncio apostólico na Geórgia e Arménia. É o único português na carreira diplomática da Santa Sé, como embaixador, tendo sido nomeado arcebispo e núncio em 26 de fevereiro deste ano.
Ferreira da Costa. O “capo ufficio” da Igreja
É um homem da Cúria Romana, onde já está há cerca de 30 anos. Foi nomeado em 28 de junho de 2011 (passaram sete anos) pelo então papa Bento XVI para “capo ufficio” – um supervisor – da secção para os assuntos gerais da Secretaria de Estado do Vaticano. Natural de Vila do Conde, com 65 anos, monsenhor António Ferreira da Costa já trabalhava nesta secretaria. Esta secção dos assuntos gerais, também conhecida pela primeira secção da Secretaria de Estado do Vaticano, tem como função “despachar as questões que digam respeito ao serviço quotidiano” do Papa, “quer na solicitude pela Igreja universal quer nas relações com os dicastérios da Cúria Romana”. Trata da redação dos documentos que o Papa lhe confia, executa os atos relativos às nomeações da Cúria Romana e guarda o selo de chumbo e o anel do Pescador, as insígnias oficiais do Papa.
Mário Rui de Oliveira. Do direito para a poesia
Mário Rui de Oliveira é o chanceler do Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, tribunal superior onde está desde 2007 e no qual se apreciam também pedidos de nulidade matrimonial, que chegam à última instância em Roma, depois de analisados nos respetivos países. Gosta dos U2, de passear na desordem das ruas de Roma ou participar nas orações da Comunidade de Santo Egídio, que há anos teve um papel determinante de mediação na paz de Moçambique. Canonista, que é como quem diz especialista em Direito Canónico, Mário Rui de Oliveira publicou poesia, traço comum a José Tolentino Mendonça, com quem partilha também refeições, ele que aprecia uma boa pasta.
Saturino Gomes. O juiz da Rota Romana
O monsenhor Manuel Saturino Gomes é outro homem do direito na Cúria. Doutorado em Direito Canónico pela Universidade Pontifícia Lateranense, de Roma. Foi diretor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa entre 1996 e 2002. Em janeiro de 2014 foi nomeado auditor do Tribunal da Rota Romana, a instância que julga processos de apelo ao Papa e causas provenientes dos tribunais de primeira instância da Santa Sé. Na Rota Romana também são julgadas causas reservadas ao Papa, relativas a chefes de Estado, cardeais, bispos, dioceses e outros assuntos internos da Igreja. É o único português a integrar o colégio de juízes da Rota Romana.
António Saldanha. O homem que verifica a santidade
Açoriano do Faial, António Manuel Machado de Saldanha e Albuquerque foi nomeado monsenhor em dezembro de 2012 pelo Papa Bento XVI. Está na Congregação para as Causas dos Santos, como responsável pelo “studium”, onde se prepara os novos postuladores das causas. Ou seja, é António Saldanha quem verifica se há razões para que uma pessoa deva ser beatificada ou santificada. “A caminhada para Deus é como o percurso escolar. A maioria passa com 9,5 e os que tiram nota 20 são os santos”, justifica junto dos amigos.
José Manuel Ribeiro. Zelador dos ritos e das normas
José Manuel Pereira Ribeiro Gomes foi ordenado em 1988 e está hoje na Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, em Roma, órgão de que faz parte como conselheiro o bispo de Bragança, José Manuel Cordeiro, diocese da qual é também originário. É esta congregação que zela pelo cumprimento de ritos e normas católicas. Há quem aponte à Congregação do Culto Divino o facto de ser uma “inquisição” moderna, por lhe competir garantir a pureza da doutrina e de sacramentos.
Nuno Gonçalves. O reitor da Universidade Gregoriana
Nomeado pelo Papa Francisco, em fevereiro de 2016, como reitor da Universidade Pontifícia Gregoriana de Roma, o padre Nuno da Silva Gonçalves, jesuíta, já era da casa, sendo decano da Faculdade de História e Bens Culturais da Igreja da Pontifícia Universidade Gregoriana desde 2012. É lisboeta.
José Alfredo Patrício. O reitor do Colégio Português
É outra nomeação recente – de dezembro de 2017 – e o padre José Alfredo Patrício, de Lamego, foi escolhido pela Conferência Episcopal Portuguesa para reitor do Pontifício Colégio Português, em Roma.
Agostinho Borges. O reitor da igreja dos “portoghesi”
A Igreja de Santo António dos Portugueses, na Via dei Portoghesi, em Roma, é ponto de encontro da comunidade lusa na capital italiana. Da diocese de Vila Real, Agostinho Borges é o seu reitor desde 1995.
Os conselheiros que vão de Portugal a Roma