O Centro Hospitalar Lisboa Norte abriu um processo disciplinar a um médico otorrino que alegadamente aconselhou a mãe de um doente a não aceitar a cirurgia ao seu filho porque a equipa não saberia realizar a operação.
Numa carta enviada à Ordem dos Médicos, a que a agência Lusa teve acesso, a administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte – CHULN (a que pertence ao Santa Maria) relata que instaurou um processo disciplinar a um médico do serviço de otorrinolaringologia que terá tentado dissuadir a mãe de uma criança de 11 anos de aceitar a realização de uma cirurgia que estava prevista e marcada.
A criança acabou por ser submetida à operação, que consistia na colocação de um implante coclear, no dia 25 de março.
A mãe do doente informou por escrito a diretora clínica do hospital de que o médico em causa a contactou dias antes da cirurgia a indicar que não aceitasse a operação, “porque a equipa (…) não sabe fazer a cirurgia”, segundo a carta a que a Lusa teve acesso.
A mãe relata ainda que o médico, que não acompanhava a criança, terá obtido o seu número de telefone através da direção da escola do filho, depois de tentar, sem sucesso, consegui-lo através da assistente social.
A agência Lusa contactou a administração do CHULN, que se escusou por enquanto a dar esclarecimentos porque decorre o processo disciplinar.
Segundo fontes hospitalares, a cirurgia à criança de 11 anos decorreu bem e na operação participaram três profissionais do Centro Hospitalar Lisboa Norte (Santa Maria) e dois do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, sendo dois deles os diretores de serviço de otorrino dos dois hospitais.
O Centro Hospitalar de Coimbra é um centro de referência na área dos implantes cocleares e está a trabalhar em rede com o Centro Hospitalar Lisboa Norte.
Contactado pela Lusa, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, afirma que ainda não teve oportunidade de ler a carta enviada pelo Centro Hospitalar Lisboa Norte, mas, pelo que lhe foi transmitido, adianta que “a situação é preocupante e tem de ser analisada e esclarecida”.
O serviço de otorrino do Santa Maria tem estado envolvido em polémica desde que, em 2016, foi nomeado Leonel Luís como diretor de serviço.
Em finais de 2017, o Sindicato dos Médicos da Zona Sul apresentou uma denúncia no MinistérioPúblico e autoridades de saúde contra o diretor do serviço de otorrinolaringologia, que acusa de irregularidades e perseguição.
No ano passado foi a vez de o diretor do serviço entregar no Ministério Público uma queixa crime por difamação e denúncia caluniosa contra a direção do Sindicato dos Médicos da Zona Sul e contra cinco colegas otorrinolaringologistas.
Fontes ligadas ao processo adiantaram à agência Lusa que o processo disciplinar agora instaurado pela administração visa um desses cinco colegas, médico que terá alegadamente obtido de forma indevida o contacto da mãe de um doente e terá tentado convencê-la a não realizar a cirurgia.
Também no ano passado, a Ordem dos Médicos decidiu que o Hospital Santa Maria tinha suspensa a sua autorização para formar internos na especialidade de otorrinolaringologia “por não estarem reunidas as condições exigíveis”. A Ordem prometeu uma avaliação no prazo de 12 meses, que estarão quase a esgotar-se.
À Lusa, o bastonário Miguel Guimarães indicou ter já solicitado ao colégio de especialidade de otorrino que avaliasse a capacidade formativa, tendo feito o mesmo pedido ao colégio de pneumologia em relação à idoneidade formativa (capacidade de formar internos) no hospital Pulido Valente, também pertencente ao Centro Hospitalar Lisboa Norte.