O BE apareceu há 20 anos para “preencher um vazio” e pôr fim à fragmentação em pequenos grupos, acolhendo “um setor da esquerda órfão politicamente”, um partido que para os seus fundadores sempre foi de protesto e solução.
Foi em 28 de fevereiro de 1999 que se realizou a assembleia de fundação do Bloco de Esquerda (BE), partido que cumpre 20 anos de uma história contada à agência Lusa pela coordenadora nacional, Catarina Martins, e pelos fundadores Francisco Louçã, Luís Fazenda e Fernando Rosas, em entrevistas a serem divulgadas na íntegra na quinta-feira, data que assinala as duas décadas.
Na “ressaca” da derrota no referendo à despenalização do aborto em Portugal, em 1998, o ex-coordenador bloquista Francisco Louçã lembra que se constatou que “era preciso muito mais do que uma junção de esforços numa coligação ocasional por eleições”, mas sim “um novo partido, uma nova força, uma nova esperança, um novo movimento”, traduzido no Bloco de Esquerda.
“Tinha acabado o tempo da dispersão e da fragmentação, aquele tempo tremendo, em que toda a gente, se tem uma pequena diferença, faz um partido novo. Isso acabou. Não é assim que se faz a política na esquerda. A política na esquerda faz-se juntando, criando coragem, criando capacidade, aprendendo”, afirma Louçã.
Quer Fernando Rosas quer Luís Fazenda olham para o aparecimento do partido como o “preencher de um vazio político” uma vez que a esquerda estava “dividida em vários grupos” que não tinham representação.
“Havia um setor da esquerda que estava órfão politicamente e que ia votando nas eleições na lógica suicidária do mal menor”, considera Fernando Rosas.
A atual líder bloquista, Catarina Martins, partilha desta ideia das “pessoas que estavam órfãs de espaço político” à esquerda, sendo ela própria “um bocadinho a prova disso”.
“Eu não seria parte de nenhum dos partidos que deram origem ao Bloco e o Bloco é o meu espaço político desde sempre”, admite, contando que só se tornou aderente do partido em 2010, depois de já ter sido eleita deputada independente.
Os partidos a que Catarina Martins se refere são os entretanto extintos Partido Socialista Revolucionário (PSR), União Democrática Popular (UDP) e Política XXI.
Luís Fazenda, que então era o secretário-geral da UDP, relata que foi o partido que liderava que tomou a iniciativa dos primeiros contactos que juntaram Fernando Rosas, Francisco Louçã (à época PSR), e Miguel Portas (então Política XXI), o grupo dos quatro rostos denominados comummente como os fundadores do partido.
O Lacerda, um restaurante de Lisboa de um “velho militante da UDP”, serviu para longas horas de “partir pedra” entre estes quatro fundadores, reuniões que na perspetiva de Louçã “não foram difíceis porque o entendimento chave era sair da política dos pequenos grupos” e “juntar capacidades muito diferentes”.
É, aliás, na unidade – sem unanimismo – e na capacidade de fazer convergências apesar das diferentes sensibilidades que, para os nomes mais destacados do BE, reside a progresso do partido, cuja morte tem sido anunciada ciclicamente desde a fundação, ironiza Rosas.
E à pergunta se o Bloco é um partido de protesto ou de solução, a opinião é unânime e traduzida nas palavras de Fernando Rosas: “Um partido deve ser de protesto e de solução, ou seja, protesta contra coisas para as quais tem respostas de solução”.
Na história do partido – que teve um dos períodos mais conturbados na sucessão de Francisco Louçã após 13 anos como rosto de liderança – houve muitas saídas, algumas com mais destaque como as de Ana Drago ou Daniel Oliveira, e até uma solução de coordenação bicéfala, modelo que não durou muito tempo.