REN e EDP rejeitam hipótese de enterrar cabos elétricos no solo

A nova lei sobre as linhas de alta e muito alta tensão deixa em aberto a hipótese de novas linhas subterrâneas. REN e EDP dizem que é demasiado caro

Enquanto entidades responsáveis pela rede elétrica e pela distribuição de eletricidade a nível nacional, a REN – Redes Energéticas Nacionais e a EDP Distribuição, respetivamente, são as principais visadas pela lei que dita que as novas linhas de alta e muito alta tensão não podem passar sobre hospitais, escolas, lares de terceira idade, parques infantis, instalações desportivas e edifícios residenciais. Além disso, a lei prevê a adoção de “soluções técnicas de minimização dos impactos da instalação da linha de transporte ou de distribuição de eletricidade sobre as infraestruturas em causa”, o que deixa em aberto a possibilidade de os cabos poderem ser subterrâneos.

No entanto, tanto a REN como a EDP Distribuição rejeitam este cenário de enterrar linhas de alta e muito alta tensão, sublinhando que já cumprem as normas de segurança em relação aos campos eletromagnéticos. E mais: ambas garantem que a solução das linhas subterrâneas é muito dispendiosa. Dez vezes mais cara, precisou o presidente executivo da REN, Rodrigo Costa, na apresentação de resultados da empresa, enquanto fonte oficial da EDP Distribuição diz que “a construção de uma rede subterrânea tem um custo seis vezes superior a uma rede aérea”.

Da mesma forma, o relatório do grupo de trabalho para os campos eletromagnéticos, publicado em 2017, concluiu que o custo de enterrar linhas “é tipicamente entre 13 a 20 vezes mais elevado”. E também que os valores “de campo magnético à superfície são superiores face aos que se verificam em linhas aéreas”. O mesmo relatório reconhece que “as linhas de transporte de eletricidade têm um profundo impacto social nas populações que lhes estão próximas”.

“Compreendemos que ninguém gosta de torres e de tubos”, reconheceu Rodrigo Costa, presidente da REN. João Faria Conceição, administrador executivo da mesma empresa, ressalvou que as regras definidas pela nova lei são aplicadas apenas aos novos traçados e não têm efeitos em relação à infraestrutura existente. “Isso seria bastante complicado. Todas as obrigações que estão na legislação nós já as cumpríamos. Não nos passa pela cabeça ter projetos que impliquem a passagem de linhas sobre casas ou, pior ainda, escolas e lares”, sublinhou, elogiando a exigência de, a cada cinco anos (a partir de 2018), cada operador de rede ter de apresentar planos de monitorização dos campos magnéticos.

“Há algo que nos agrada na nova lei, que é a possibilidade de disponibilizar oficialmente os níveis de monitorização. Porque vai permitir demonstrar que as linhas de alta tensão, em termos de campos eletromagnéticos, são menos nocivas do que um secador de cabelo, por exemplo”, diz o administrador

De acordo com a nova lei, quando não existir uma alternativa técnica economicamente viável ao traçado da linha elétrica, poderá ocorrer uma sobrepassagem de “infraestruturas sensíveis” desde que o proprietário das mesmas dê autorização por escrito. Terá ainda de ser cumprida uma “distância mínima entre as infraestruturas elétricas de alta e muito alta tensão e as infraestruturas sensíveis”.

“O novo decreto-lei não terá implicações para a operação da EDP Distribuição, que já toma as melhores decisões no traçado das linhas elétricas”, garante fonte oficial, explicando que a empresa mantém um programa de vigilância dos campos eletromagnéticos.

De acordo com a EDP Distribuição, uma linha elétrica subterrânea é constituída por cabos isolados, específicos para o enterramento no solo, a uma profundidade mínima de um metro, podendo também ser instalados em galerias, túneis ou caleiras. “A instalação deste tipo de linhas é bastante mais cara do que a instalação de linhas aéreas. Contudo, as linhas subterrâneas têm diversas vantagens: segurança, minimização de impactes visuais, minimização de custos de manutenção, maior tempo de vida dos cabos, menos perdas, valorização das propriedades, entre outras”, refere a EDP Distribuição no seu Guia de Boas Práticas para a integração paisagística de infraestruturas elétricas. E acrescenta: “A grande desvantagem está relacionada com a hipótese de resoluções de avarias, uma vez que se tornam mais difíceis de localizar e acarretam mais mão-de-obra e custos mais elevados devido à necessidade de remover pavimentos.”

Entrevista

“Enterrar cabos custa dez vezes mais”
Rodrigo Costa, presidente executivo da REN

Com a nova lei, a REN vai passar a enterrar cabos elétricos em novos traçados?
As regras introduzidas pela nova lei consolidam uma prática que já existe. Não houve nenhuma mudança. Portugal é um exemplo no que diz respeito a campos eletromagnéticos. Há especialistas que acham que a solução dos cabos enterrados, por exemplo, até pode ser mais perigosa para a saúde das pessoas do que um cabo que está a 15, 20 ou 25 metros de altura. Quanto ao futuro, não haverá uma alteração na forma como trabalhamos.

As novas regras para as linhas de alta tensão custarão mais ou menos dinheiro à REN?
A REN não tem nenhum interesse económico ou financeiro em deixar de fazer o que é melhor para as pessoas. Não é por custar menos que nós ganhamos mais. O interesse da REN está alinhado com o do Estado e com quem licencia os traçados da rede elétrica. É o governo que define que tipo de infraestruturas fazemos: seguimos uma política energética, temos de apresentar um plano à Direção-Geral de Energia e Geologia, que vai a consulta pública e tem de ser aprovado pela ERSE. Não há qualquer questão perversa da empresa em ter vantagem. Fazer um cabo enterrado custa dez vezes mais, no mínimo. Ninguém vai querer fazer por cem se puder fazer por dez, e ninguém vai fazer por dez se souber que ao poupar pode estar a interferir com a saúde das pessoas.

Há linhas antigas que não cumprem as novas regras?
Há muitos anos, as regras eram completamente diferentes. Mas de há algum tempo para cá trabalhamos com muito cuidado em matéria de proteção das pessoas e bens. Hoje, quando construímos rede elétrica, temos normas e preocupações que vão para lá do que é exigido por quem licencia os projetos. Temos projetos que se atrasam quase indefinidamente por causa das dificuldades em fazer os licenciamentos. As normas que seguimos são muito exigentes.

 

Fonte: DN

Foto: FERNANDO FONTES/GLOBAL IMAGENS