OPINIÃO QUE CONTA. “O outro lado da floresta” – Joana Lima, CianMira

No mês do Dia Mundial da Árvore e do Dia Internacional das Florestas, ambos a 21 de Março, falamos do outro lado da floresta. Ora leiam…

Desde Darwin que pensamos que as árvores são seres solitários, desconectados dos outros seres e que competem entre si por água, nutrientes e luz solar, em que os vencedores fazem sombra aos perdedores e lhes retiram toda a água e nutrientes. A indústria madeireira, em particular, vê as florestas como sistemas produtores de madeira de onde podem retirar lucro. Mas e se descobríssemos o outro lado da floresta? E se as árvores “falassem”? Mudaria o nosso olhar sobre as florestas?

Vários estudos científicos confirmam essa ideia: as árvores comunicam entre si. As árvores pertencentes à mesma espécie vivem em comunidade e muitas vezes formam alianças com árvores de outras espécies. As árvores das florestas evoluíram no sentido de viverem em cooperação, com relações interdependentes, mantidas pela comunicação e por uma inteligência colectiva semelhante às colónias de insectos.

Quando nos deslocamos à floresta, os nossos olhos tendem a voltar-se para cima, para observarmos as copas altas das árvores, mas é abaixo dos nossos pés que toda a comunicação acontece. Apelidada pelos cientistas de “wood-wide web”, esta rede de fungos liga as árvores e permite-lhes partilhar água e nutrientes e também comunicar. Peter Wohlleben, guarda-florestal e autor alemão, explicou: “As árvores enviam sinais de stress sobre seca e doença, por
exemplo, ou ataques de insectos, e as outras árvores alteram o seu comportamento quando recebem estas mensagens.”

Cerca de 90% das plantas terrestres têm uma relação simbiótica com fungos. Esta parceria, em que os fungos colonizam as raízes de uma planta, é conhecida como micorriza. Nas micorrizas, as plantas providenciam alimento aos fungos (em forma de hidratos de carbono – açúcares) e estes, por sua vez, ajudam as plantas a absorver água e fornecem nutrientes como fósforo e azoto.

De acordo com Suzanne Simard, da Universidade de British Columbia, em Vancouver, Canadá, as árvores-mãe (como as apelida) são as árvores maiores e mais antigas da floresta com a maioria das ligações a fungos e são estas que ajudam os rebentos a sobreviver.

Num estudo, Suzanne Simard descobriu que os rebentos à sombra – que têm mais carência de alimento – recebiam mais carbono das árvores-mãe. “Estas plantas não são os indivíduos que Darwin idealizou, a competir pela sobrevivência do mais forte”, declarou a investigadora. “De facto, elas estão a interagir entre elas, tentando
ajudar-se umas às outras a sobreviver.” A mesma investigadora referiu ainda que as árvores-mãe dão preferência aos seus rebentos, na hora da partilha de nutrientes, do que a rebentos de outras árvores.

Mas as descobertas na comunicação entre árvores não ficam por aqui: Edward Farmer da Universidade de Lausanne, na Suíça, tem estudado os impulsos eléctricos que as árvores usam na sua comunicação através da rede. Ele identificou um sistema de sinalização baseado em voltagem que parece semelhante ao sistema nervoso dos animais (embora ele não sugira que as plantas tenham neurónios e cérebros).

As árvores também comunicam através do ar, usando feromonas e outros sinais odoríferos. Um exemplo ocorre nas savanas com as acácias. Quando uma girafa começa a comer as folhas da acácia, a árvore dá conta do ferimento e emite um sinal de stress na forma de gás etileno. Depois de detectarem o gás, as acácias vizinhas começam a bombear taninos para as suas folhas. Uma quantidade grande desta substância pode adoecer ou até matar herbívoros de
grande porte.

E as girafas sabem disso. No entanto, como evoluíram com as acácias, as girafas deslocam-se na direcção oposta ao vento, para locais onde o gás não alcançou as árvores. Se não houver vento, então a girafa andará cerca de 91,44 metros – mais longe do que o etileno pode viajar em ar parado – antes de se alimentar da próxima acácia.

Mas, tal como a internet, a “wood-wide web” também tem o seu lado menos bom. Algumas plantas roubam-se umas às outras, usando a tal rede fúngica. Plantas, como a orquídea fantasma, não têm clorofila, o que as impede de realizar fotossíntese. Por isso, adquirem o carbono de que precisam de árvores próximas, através dos micélios dos fungos a que ambas estão ligadas.

Além disso, as plantas têm muitas vezes que competir com as suas vizinhas por recursoscomo água e luz. No meio desta batalha, algumas – como as acácias e algumas espécies de eucaliptos – libertam químicos que prejudicam as suas rivais ou que reduzem a disseminação de microrganismos em redor das suas raízes – um processo que se chama alelopatia. Supostamente, estas substâncias alelopáticas seriam absorvidas pelo solo ou decompostas por
microrganismos, limitando a sua expansão. Mas… um estudo realizado por Kathryn Morris verificou que os níveis de compostos produzidos pelas plantas hostis, neste caso Tagetes tenuifolia e nogueiras negras, eram 179% a 278% mais elevados em solos com a rede de fungos e que havia uma diminuição de cerca de 40% no peso de legumes plantados nesse solo.

Voltando ao início do artigo: como vê agora as nossas florestas? Se tiver ficado com a mesma impressão que eu, vamos ter que repensar toda a gestão florestal porque, tal como diz Suzanne Simard “Quando as árvores grandes e velhas são cortadas numa floresta, a taxa de sobrevivência das árvores jovens é substancialmente reduzida”.

Vamos olhar para as nossas árvores e florestas com respeito e carinho. Afinal, são seres vivos que fazem de tudo para sobreviver e oferecer ar puro a todos nós.

Joana Lima, CianMira