OPINIÃO QUE CONTA: “Biomimética: quando a Natureza serve de inspiração” – Joana Lima, CianMira

De tudo o que se sabe sobre o Homem primitivo, não restam dúvidas de que o ser humano sempre observou a natureza com atenção para que esta a ajudasse a resolver os seus problemas. Os lobos ensinaram-nos formas de caçar, as aves inspiraram-nos a voar, os castores deram-nos ideias sobre como construir barragens e até as pequenas térmitas demonstraram-nos ideias de construção que poderíamos usar. E é isto a biomimética: uma área que estuda os princípios criativos e as estratégias da Natureza com o objectivo de criar soluções para os problemas actuais da humanidade, unindo funcionalidade, estética e sustentabilidade.

Neste artigo, vou mostrar-vos alguns exemplos de biomimética que revolucionaram o nosso dia-a-dia.

  • Velcro

O velcro foi criado por um engenheiro suíço chamado George de Mestral. A ideia surgiu-lhe em 1941 quando, após uma ida à caça, removia as sementes da planta Bardana da sua roupa e do pêlo do seu cão. Curioso em descobrir como é que estas sementes se conseguiam agarrar tão firmemente à roupa e ao pêlo, resolveu observá-las ao microscópio. Constatou a existência de filamentos entrelaçados que terminavam em pequenos ganchos.

Percebendo o potencial desta característica na vida quotidiana, demorou 10 anos a conceber um processo que funcionasse da mesma forma àquele que tinha verificado na disseminação de sementes pela Bardana. O produto desenvolvido era constituído por duas partes que se complementavam: a primeira composta por pequenos pinos e a segunda por minúsculos laços. Quando se juntam, formam uma área muito aderente e adesiva. Mestral submeteu uma patente da sua descoberta em 1951 que lhe foi concedida 4 anos depois. Mal obteve a patente, decidiu iniciar a comercialização do produto e criou a companhia Velcro S.A., designação explicada pela junção de duas palavras francesas: velours (que significa veludo) e crochet (que significa gancho).

  • Vidro seguro para aves

Mais de 100 milhões de pássaros morrem anualmente na Europa por colidir com vidros e a razão é óbvia – simplesmente não reconhecem a estrutura transparente como uma barreira física. Para resolver este problema, a empresa alemã Arnold Glass estudou as grandes florestas onde as aves voam livremente e não colidem com teias de aranha. O que acontece é que as teias de aranha possuem uma fibra que reflecte a luz ultravioleta, visível para as aves. O olho humano não consegue visualizá-la. Tendo isto em conta, a empresa aplicou fibras ultravioletas nos seus vidros da linha Ornilux. Esta adaptação mitigou as colisões, preservando a transparência dos vidros aos olhos humanos.

  • Revestimento redutor de atrito para navios

Os tubarões permanecem limpos de algas devido à sua pele que é coberta por dentículos, pequenas placas ósseas que tornam a pele áspera (parecida a uma lixa). Estes ajudam a reduzir o arrasto de água e evitar que os microrganismos “apanhem boleia”. Os cientistas da NASA copiaram o padrão dos dentículos e criaram uma película. Este revestimento reduz o arrasto e impede que os microrganismos se liguem à superfície. Assim, é possível usá-los em cascos dos navios, submarinos, aeronaves e até fatos de banho, reduzindo o atrito e consequentemente a energia e o dinheiro gasto (por exemplo, em combustível).

  • Comboio Shinkansen

O Japão é conhecido pelos seus comboios incrivelmente rápidos e eficientes. Contudo, com velocidades a exceder os 300 Km/h, os comboios apresentaram um problema ao criar um enorme e desagradável efeito sonoro sempre que emergiam de um túnel. Como resultado da mudança da pressão do ar, esta fonte de poluição sonora perturbava os residentes locais. Os engenheiros começaram a procurar soluções. Nos anos 90, o engenheiro japonês Eiji Nakatsu verificou que os guarda-rios conseguiam mergulhar na água a grande velocidade e quase sem som de salpicos.

O seu comboio Shinkansen, baseado no bico do guarda-rios, não só reduziu o barulho do comboio como também aumentou a sua aerodinâmica, viajando 10% mais rápido e utilizando menos 15% de electricidade do que antes.

  • Mobília de micélio

A empresa americana Ecovative tem como principal objectivo substituir materiais como o plástico e a esferovite. Deste modo, produz embalagens e produtos – desde cadeiras a isolantes acústicos – com micélio (“raiz” de cogumelos) e restos orgânicos de fazendas locais. Os produtos são 100% biodegradáveis e têm preço e desempenho competitivo com os materiais convencionais. A empresa, inclusive, apresenta clientes como a Dell e Ikea. Ou seja, podemos comprar um computador ou uma mesa e recebê-los embalados neste material. Depois, até podemos enterrá-lo no quintal ou jardim, usando-o como adubo.

Estes são cinco das muitas invenções que o Homem produziu, mas que a Natureza criou. Da próxima vez que fores dar um passeio pela natureza, de certeza que a verás com outros olhos.

Joana Lima, CianMira